12/09/2018
Fonte:https://manuelzao.ufmg.br/povos-tradicionais-nortearam-roda-de-conversa-no-festivelhas/Mediada pela arqueóloga e historiadora, Alenice Baeta, a roda de conversa sobre “Os Povos Tradicionais do Rio das Velhas” foi realizada no sábado (8), dentro da programação do FestiVelhas, em Jequitibá. A roda reuniu representantes indígenas, quilombolas, carroceiros e agricultores.
“Juntos somos mais fortes, cada um à sua maneira”, assim o indígena Merong Kamakã deu início à conversa com representantes dos povos tradicionais do Rio das Velhas. Após o canto ancestral que homenageou os rios, matas e todos os seres da floresta, entoados pelos índios Merong e Kapua Lana Puri, todos os presentes fizeram um minuto de silêncio em pesar à Luzia, o fóssil humano mais antigo das Américas, e a todas as demais perdas sofridas no incêndio ocorrido no Museu Nacional no dia 2 de setembro, no Rio e Janeiro.
Na sequência, foi passada a palavra para o coordenador do Projeto Manuelzão, Marcus Vinícius Polignano, que salientou a importância do encontro com os povos tradicionais para que seja possível renovar a força e continuar lutando pela preservação ambiental. “Nós não vamos conseguir resgatar água se nós não nos resgatarmos”, reforçou. Polignano ainda sugeriu que os participantes e espectadores da conversa, realizada sob a sombra de uma árvore na praça da igreja de Jequitibá, retirassem seus calçados para sentir a terra e ampliar a conexão com a natureza naquele momento.
A relação com a terra fez parte dos discursos dos indígenas Merong e Kapua. “Não acreditem quando falarem que o indígena invadiu terras. A gente tinha todo o Brasil para migrar. Onde existe área indígena, existe preservação”, defendeu Merong. Kapua completou: “o rio é como um irmão nosso, se ele morrer, todo mundo morre; a terra para o indígena é um lugar sagrado”.
Pai Tico, representante das religiões de matriz africana, falou sobre a cultura da umbanda, das guardas de reinado e pediu respeito à sua religião e práticas. “Estou aqui para reivindicar uma coisa que não é só para mim, que é o espaço de expressão, o espaço de liberdade. A gente só quer nosso espaço.” O pai de santo deixou, ao fim de sua fala, uma mensagem de força para os outros representantes de povos tradicionais presentes: “vamos brigar nem que seja com a última gota de suor!”.
Por parte dos carroceiros, Gilmar Adalberto, José de Souza, Claudio de Jesus e Admir dos Santos salientaram em suas falas, os anos de trabalho puxando carroça e como essa atividade é importante para a sustentação de suas famílias e criação de seus filhos. Eles ainda entoaram com orgulho a frase estampada em suas camisetas: “A cidade é nossa roça, nossa luta é na carroça!”. José Geraldo Silvério falou em nome dos agricultores familiares sobre a preservação do território e o orgulho de ser “Amigo do Rio”, do Projeto Manuelzão. “Minha relação com o Manuelzão foi amor à primeira vista e casamento indissolúvel”, disse o agricultor.
A conversa foi assistida por cerca de 50 pessoas, que também se envolveram e dançaram numa bela homenagem aos povos da região. Presente na ocasião, o diretor da faculdade de medicina da UFMG, Humberto José Alves, pontuou a importância do Projeto Manuelzão e da saúde ambiental. “Em relação à preservação das águas e do meio ambiente, a sociedade tem tendido a não valorizar adequadamente. Movimentos como o FestiVelhas trazem a academia para a comunidade, para a realidade, provocando o diálogo e favorecendo a saúde como um todo.” Rogério Sepúlveda, Engenheiro, Presidente do CBH Velhas 2007-2013 e colaborador do Projeto Manuelzão, esteve na roda de conversa e destacou o valor e a sabedoria existente nesses povos. “As manifestações de fé são elementos que podem ser transformadores e não precisa, obrigatoriamente, salvar as águas, mas ajuda a aproximar as pessoas, seja pelas suas afinidades religiosas, culturais ou territoriais. Esse momento é uma forma de conhecer também as dificuldades que as pessoas vivem, dificuldades de sobreviver, de alimentar, de cuidar dos filhos. Acho que é por aí que está a essência e as possibilidades que o FestiVelhas pode abrir, de aproximar as populações que, muitas vezes, são desrespeitadas e excluídas.”
Estiveram na roda de conversa também Emmanuel Almada, professor da UEMG e membro do grupo de pesquisa Kaipora; Kele Amaral, representante da associação sem fins lucrativos Amanu; Rosana Avelar e Regina Campos, membros do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes). Todos falaram sobre os trabalhos realizados em suas entidades em apoio aos quilombolas, agricultores familiares, artesãos e outras comunidades tradicionais.