Distinção regulamentada pelo Conselho Universitário equivale ao grau de doutor
Pessoas que não frequentaram o universo acadêmico, mas que dedicaram suas vidas à aquisição, constituição e transmissão de conhecimentos tradicionais de relevância social e coletiva para suas comunidades poderão ser reconhecidas pela UFMG com o título de Notório Saber, regulamentado recentemente pelo Conselho Universitário.
Trata-se de uma titulação acadêmica em nível de doutorado que poderá ser outorgada a detentores de saberes de tradições indígenas, afro-brasileiras, quilombolas e outras oriundas das culturas populares. Pessoas que dominam saberes científicos, artísticos e culturais já presentes na Universidade, mas que desenvolveram sua trajetória fora da academia também poderão ser contempladas com a distinção.
“É uma medida pioneira e inédita nas universidades brasileiras. A UFMG passa a reconhecer e legitimar formalmente a entrada de outras epistemes e formas de pensamentos, filosofias, práticas e valores que não são da matriz ocidental eurocêntrica e fazem parte do conhecimento científico, artístico e cultural produzido na Universidade”, avalia a reitora Sandra Regina Goulart Almeida.
Um dos autores da proposta, que foi aprovada por meio de resolução complementar do Conselho Universitário, é o professor César Guimarães, do Departamento de Comunicação Social da Fafich e coordenador da Formação Transversal em Saberes Tradicionais. “A UFMG realiza um gesto de vanguarda na produção do conhecimento, ficando mais inclusiva e diversa, em diferentes dimensões. Assim, ela se torna mais pluriepistêmica, plurirracial, pluriétnica e plurilinguística”, afirma.
Ao longo de uma vida De acordo com a resolução aprovada no fim de maio, os candidatos devem ser indicados aos colegiados dos cursos de pós-graduação que contemplem áreas de conhecimento equivalentes à do Notório Saber a ser avaliado.
César Guimarães ressalta que, diferentemente de uma tese de doutorado, desenvolvida de acordo com os protocolos acadêmicos, o Notório Saber, no domínio dos saberes tradicionais, é adquirido ao longo de uma vida, predominantemente por meio da oralidade e com base em práticas, métodos e processos distintos daqueles da ciência ocidental.
Essa trajetória é registrada por meio de um memorial – de caráter descritivo, crítico e analítico – que visa documentar, de maneiras variadas, essas “biografias extraordinárias”, diz César Guimarães, recorrendo a uma expressão usada pelo professor José Jorge de Carvalho, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, instalado na UnB. Carvalho participou da primeira reunião na UFMG que inspirou a Instituição a formular essa resolução.
O memorial, a formação e o percurso desenvolvido pelo candidato em relação ao saber do qual é portador serão examinados por uma comissão de avaliação de mérito indicada pela Câmara de Pós-graduação. Essa comissão, que exercerá papel similar ao de uma banca de defesa de doutorado, reunirá cinco professores – ao menos dois deles serão de fora da instituição.