Multas da Vale se transformam em acesso a áreas estratégicas para a empresa

20/07/2020

Amélia Gomes / Belo Horizonte | Brasil de Fato MG

Fonte:https://www.brasildefatomg.com.br/2020/07/20/multas-da-vale-se-transformam-em-acesso-a-areas-estrategicas-para-a-empresa

Acordo converte multas do crime em Brumadinho em aval para entrada da mineradora em reservas ambientais

Brumadinho, obra, mineração
“Essas áreas são estratégicas para Vale, que pleiteia atuar nessas regiões há vários anos” – Midia Ninja

No início deste mês o governo federal, por meio do Ministério do Meio Ambiente, o governo de Minas Gerais, sob o comando de Romeu Zema (Novo) e a mineradora Vale firmaram um acordo que converte as multas aplicadas à empresa pelo Ibama em “investimentos” em sete parques nacionais de Minas Gerais: Caparaó, Grande Sertão Veredas, Caverna do Peruaçu, Sempre-Vivas, Serra do Gandarela, Serra da Canastra e Serra do Cipó.

O documento, assinado no último dia 6, é referente à compensação imposta à Vale pelo maior crime socioambiental cometido pela empresa: o rompimento da barragem de Córrego do Feijão, em 25 de janeiro de 2019, que deixou quase 300 vítimas fatais. De acordo com o termo, o recurso se dividirá sendo R$ 150 milhões destinados para obras nos parques e R$ 100 milhões em obras de saneamento e no Programa Lixão Zero.

No entanto, movimentos sociais denunciam que na verdade o acordo não passa de uma manobra para que a mineradora tenha acesso às reservas ambientais que são de interesse da empresa. Há tempos Ricardo Salles, atual ministro do Meio Ambiente, tentava converter a punição da minerada em “prêmio”. Em abril de 2019, o ministro twittou em sua conta pessoal que estava tentando realizar o acordo, agora firmado.

Luiz Paulo Siqueira, da coordenação do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), denuncia que o episódio é um exemplo de como a Vale está articulada dentro dos governos.

“Essas áreas são estratégicas para a Vale, ela já pleiteia atuar nessas regiões há vários anos. Na Serra do Cipó, onde ficam os municípios de Conceição do Mato Dentro e Morro do Pilar, a Vale possui vários direitos minerários e projetos de exploração”, explica.

O dirigente alerta ainda que o avanço da mineradora pode comprometer o abastecimento na região metropolitana de BH. “No Parque da Gandarela, ela tem um grande projeto com expectativa de exploração de 40 milhões de toneladas por ano. Durante muito tempo a população tem conseguido barrar o avanço desse projeto, mas esse acordo coloca tudo em risco”, adverte.

“É permitir que novos crimes aconteçam”

Apesar das multas serem relativas a penalidades que a empresa cometeu como “causar poluição que acarretem danos à saúde humana” e “causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento de água”, como cita o documento do Ibama, a compensação do crime, não reverte nenhum dos danos, pelo contrário. É o que avalia Eloá Magalhães, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

“Nos dois crimes, a Vale sempre nega a contaminação do rio, a destruição de sítios arqueológicos, da vegetação, a morte de animais silvestres e o que os desdobramentos das contaminações vão causar ao longo dos anos. Então, fazer um acordo desse é permitir que novos crimes contra o meio ambiente aconteçam”, aponta.

Eloá ressalta que o acordo, assim como outras ações da empresa, apenas maquiam a situação, e que na prática a mineradora nunca soluciona os problemas ambientais e sociais causados por ela. Outra reivindicação dos atingidos é que em momento algum as comunidades envolvidas foram ouvidas sobre o caso.  “Nunca há debate com as comunidades atingidas. A postura de atuação da Vale é fazer acordos como este, por cima, arbitrários, sem a participação dos atingidos”, denuncia a militante.

A postura não se restringe à mineradora. O próprio ministro do Meio Ambiente chegou a afirmar que “o acordo serviu para evitar uma longa discussão de aplicação de recursos”, como declarou Salles em reportagem à Agência Brasil.

Parques estaduais já estão no “balcão” de Zema

Desde o dia 2 de julho está aberto o edital do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) para a concessão do Parque Estadual do Ibitipoca à iniciativa privada. O edital é o primeiro da lista de 21 parques estaduais que estão na lista do Programa de Concessão de Parque Estaduais, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.

Edição: Elis Almeida

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