Arte: Secom/PGR
Nesta quarta-feira, 30 de setembro, o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP/MG), a Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPE/ES) e a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPE/MG) peticionaram ao Juízo da 12ª Vara Federal requerendo o imediato retorno do andamento processual da Ação Civil Pública nº 0023863-07.2016.4.01.3800, popularmente conhecida como a “Ação Civil Pública dos 155 bilhões”.
Ajuizada pelo MPF em 2 de maio de 2016, a ação pede a condenação da Samarco, Vale e BHP Billiton na obrigação de reparar integralmente os danos socioambientais e socioeconômicos causados pelo desastre do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido no dia 5 de novembro de 2016, em Mariana (MG). O valor das reparações foi estimado, nesta ação, em R$ 155 bilhões de reais. Também são réus na ação a União e o Estado de Minas Gerais.
Em 08 de agosto de 2018, o Juízo Federal suspendeu o andamento da ação, com base em uma previsão que consta do acordo firmado no dia 25 de junho de 2018, o TAC Governança (TAC-Gov), assinado pelo MPF, MP/MG, MP/ES, DPU, DPE/MG, DPE/ES, bem como pela União, pelos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, pelas entidades das respectivas administrações indiretas, e pelas empresas Samarco, Vale e BHP Billiton Brasil.
O TAC-Gov foi homologado integralmente pelo Juízo Federal, que, na mesma data, suspendeu o andamento da ação, conforme expressa previsão do próprio acordo.
Repactuação dos programas de reparação – O TAC-Gov tem por objetivo final a repactuação, com a participação dos atingidos, dos programas de reparação integral dos danos socioambientais e socioeconômicos causados pelo desastre do rompimento da barragem de Fundão.
A questão é que, para tornar efetiva a participação da população atingida, condição essencial para a legitimidade das decisões a serem tomadas quanto à repactuação, o TAC-Gov afirmou a necessidade de se efetivar a contratação das assessorias técnicas independentes que haviam sido previstas em um outro acordo anterior firmado com as empresas rés. Tais entidades de assessoria técnica, escolhidas pelas próprias pessoas atingidas, são custeadas pelas empresas, mas devem ser totalmente independentes em relação a elas.
Todo o processo de escolha foi realizado pela população atingida e inclusive homologado judicialmente, mas apenas cinco assessorias técnicas estão contratadas até o momento, três delas antes mesmo da celebração do TAC-Gov. Restam ainda 16 territórios atingidos, nos quais a população afetada pelo desastre já escolheu suas assessorias técnicas independentes, mas a contratação pelas empresas ainda não se efetivou, em parte devido a inúmeros obstáculos colocados pelas empresas rés para a contratação.
Além disso, o impasse trazido pelas empresas rés, ao não contratarem as assessorias técnicas independentes – mesmo após os acordos firmados, nos quais elas assumiram a responsabilidade e a obrigação legal dessa contratação – também é impeditivo da própria repactuação, uma vez que o funcionamento dessas entidades é condição essencial para que tal discussão possa ser levada adiante, já que, sem as assessorias, os atingidos ficam excluídos do processo de renegociação.
Após dois anos, não se veem efetivos progressos na construção dos canais participativos previstos no TAC-Gov, o que acarretou o surgimento de vias paralelas de discussão à revelia das instituições de Justiça.
De acordo com as instituições de Justiça, o longo tempo para a implementação de programas reparatórios e participativos trouxe para dentro das comunidades uma série de conflitos, maléficos para vida em sociedade, agravando ainda mais os danos decorrentes do rompimento da barragem de Fundão.
“Sem conhecimentos das Defensorias Públicas e dos Ministérios Públicos, novas partes estão atuando na representação coletiva das comunidades atingidas, em total desrespeito às previsões procedimentais do TAC-Gov e da legislação brasileira, o que, além de juridicamente inconcebível, tem provocado verdadeiro tumulto processual, com aplicação e criação de fluxo, interpretações distintas e aplicação de ressalvas não previstas na época da homologação do acordo, numa dinâmica que, obviamente, irá prejudicar a reparação justa, ampla e completa sob a ótica coletiva e individual”, informam os autores da petição.
Condições para retomada da ação – A petição destaca que os eventos que o TAC-Gov estabeleceu como significativos já ocorreram: “a) expirou-se o prazo de dois anos, contados da homologação do acordo, o que se deu no dia 8 de agosto de 2020; b) não houve novo ajuste entre as partes para prorrogar o prazo de suspensão da demanda objeto, especificamente, da presente ação civil pública; c) o processo de repactuação foi obstado, diante da não implementação das assessorias técnicas, que é condição necessária para a repactuação, conforme o que foi acordado entre todas as partes do TAC-Gov e homologado em Juízo”.
Os autores da petição defendem que, desde o dia 9 de agosto passado, o processo já deve ser considerado em tramitação regular, uma vez que, nos termos do art. 313, §5º, do CPC, “O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no § 4º”.
Ministérios Públicos e Defensorias Públicas também observam que “o TAC-Gov continua tendo força de título executivo judicial, permanecendo as empresas compromissárias obrigadas a cumprir todas as obrigações nele assumidas, sob pena de incidência das sanções respectivamente cominadas e sem prejuízo do cumprimento forçado de cada uma das obrigações descumpridas” e a retomada do andamento da ação não irá desobrigá-las de cumprir o que foi acordado e homologado em juízo, além de não interromper qualquer tipo de reparação individual da Fundação Renova que esteja em curso, pois, se for o caso, após a instrução e julgamento da ação, proceder-se-á a complementação dos valores já pagos.
A retomada da ação civil pública tem por objetivo principal não permitir que as empresas Samarco, Vale e BHP Billiton se exonerem de suas responsabilidades com as consequências do desastre do Rio Doce. Portanto, com a retomada do andamento processual, as instituições de Justiça esperam que possam ser decididas as questões não contempladas pelos acordos firmados entre as partes, que possa ser determinado o cumprimento das obrigações já estabelecidas e ainda não cumpridas e que se possa inclusive aferir os novos danos causados pela conduta das empresas rés na protelação de todo o processo de reparação e compensação.
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