25/01/2021
[Lembramos que a Misereor é parceira de longa data do Cedefes nas ações de apoio as lutas dos quilombolas em Minas Gerais]
Desde o trágico crime de Brumadinho, ocorrido no dia 25 de Janeiro de 2019, custa dar início ao novo ano com os típicos votos de otimismo e de esperança. Desde há dois anos que o mês de Janeiro dos familiares e amigos das 272 vítimas mortais do crime é marcado por sentimentos de dor, perda, tristeza e angústia. Infelizmente, os desenvolvimentos tanto no âmbito político como no campo da justiça dificultam o “olhar em frente”.
Como olhar em frente perante a lentidão dos processos de reparação?
Como olhar em frente perante o facto de ainda ser desconhecida da localização dos restos mortais de 11 vítimas?
Como olhar em frente, se apenas no Estado de Minas Gerais dez barragens de rejeito da Vale S.A. se encontram em nível de emergência, quatro delas correndo risco de ruptura iminente?
Como olhar em frente, se são as próprias empresas que continuam encarregadas de estudos de impacto e de monitoramento das suas barragens de rejeito?
Como olhar em frente, se a conduta irresponsável da Vale S.A. levou a mais uma desnecessária morte de um trabalhador na mina Córrego do Feijão no passado mês de Dezembro?
É com muita amargura que acompanhamos a situação em Brumadinho, Minas Gerais e em todo o Brasil em relação ä mineração. Nos deixa sem palavras que dois crimes com repercussões gravíssimas não tenham levado a uma mudança fundamental na forma como as autoridades controlam as empresas mineradoras, nos requisitos que o Estado impõe às atividades minerárias, na forma como as empresas exploram os recursos e tomam suas decisões econômicas. 0 lema pelo qual decisores politicos e a economia privada se continuam regendo parece permanecer inalterado: Lucro acima da preservação da vida.
Hoje, dirigimo-nos a vocês, companheiros e companheiras de luta incansáveis, com nossa humilde mensagem de solidariedade. Sabemos que não são estas nossas palavras que trarão a mudança, a justiça, a reparação integral tão ansiadas por vocês. Nossa intenção é manifestar que a dor sentida em Brumadinho, ecoa também aqui na Alemanha. Estejam cientes de que todo o sofrimento continua bem visível para nós. Mesmo que a erva verde cresça sobre a lama e encubra os sinais mais evidentes do crime, os testemunhos dos que sofrem se fazem ouvir de forma imponente além fronteiras!
Com esta carta não queremos apenas expressar nossa solidariedade, mas também nosso profundo agradecimento pelo seu empenho inesgotável ao lado das famílias das vítimas e dos demais impactados. Desde comunidades indígenas e quilombolas, a agricultores e agricultoras, cujos meios de subsistência foram destruidos, até ä população em geral, que vive com o temor constante de consumir água contaminada. Estamos cientes do enorme esforço que vocês fazem para manter a chama da esperança acesa para todos os que por vocês são acompanhados. Principalmente no contexto atual da pandemia, que obrigou ä redefinição das suas estratégias e atividades. Contexto este, que, infelizmente, foi e está sendo usado por vários politicos e empresas mineradoras para levar avante seus objetivos questionáveis. Comportamento cobarde, que parece desconsiderar que a sociedade civil brasileira é perspicaz e não vê os obstáculos colocados em seu caminho para assumir uma postura “de braços cruzados”, mas sim, corno motivo para reforçar ainda mais sua ação!
Hoje, Misereor está de luto com vocês. Contudo, hoje e em todos os outros restantes dias do ano, Misereor também assume urna atitude de intransigência em relação ä injustiça que observa. 0 caso de Brumadinho assume um lugar central na nossa estratégia de incidência política junto ao governo alemão e aos organismos da União Europeia. A nossa clara demanda continua sendo a responsabilização da Vale S.A. e da Tüv Süd. Nosso apelo é que não nos deixemos intimidar pelos desafios que se nos colocam e que juntos demos continuidade a esta caminhada conjunta, unidos na fé e na confiança de que dias mais risonhos nos esperam!
Reforçando mais uma vez nosso compromisso de apoio, nos despedimos com solidários abraços, Também em nome de todos do Dept. da América Latina,
Dr. Martin Brockelmann-Simon (Diretor de Cooperação Internacional)
Dr. Dieter Richarz (Chefe do Dept. da América Latina)
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