05/05/2021
Área em processo de demarcação deve ser incluída nos sistemas da Funai e do Incra
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que seja reconhecida, nos sistemas pertinentes, a Terra Indígena Kaxixó, localizada no município de Martinho Campos, região centro-oeste de Minas Gerais.
A Instrução Normativa 09/2020 (IN 09/2020) exclui as terras indígenas em processo de demarcação (terras indígenas delimitadas, declaradas, demarcadas fisicamente e interditadas) do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), que é uma ferramenta eletrônica desenvolvida pelo Incra e pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para subsidiar a governança fundiária do território nacional.
Por meio do Sigef, é realizada a certificação de dados referentes a limites de imóveis rurais, valendo a certidão para a finalidade legal de se atestar que não há sobreposição com outros imóveis constantes do seu cadastro georreferenciado. Para o MPF, a IN 09/2020 da Funai, ao não considerar as terras indígenas em processo de demarcação para a emissão da Declaração de Reconhecimento de Limites, nem para a análise de sobreposição por servidores credenciados no Sigef, atenta contra a segurança jurídica e a regularidade fundiária nacional.
“A norma viola a publicidade e a segurança jurídica, ao desconsiderar por completo terras indígenas delimitadas, terras indígenas declaradas e terras indígenas demarcadas fisicamente e cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, podendo gerar aumento dos conflitos fundiários”, diz um dos trechos da ação. Por esses motivos, o MPF requer, entre outros pontos, que seja incidentalmente declarada nula a IN 09/2020 da Funai, que coloca em risco o território do Povo Kaxixó.
Pedidos – A ação também pede, inclusive liminarmente, que a Funai, em até 24 horas mantenha ou inclua no Sigef e no Sistema de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), a Terra Indígena Kaxixó, nos termos do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID), aprovado pela própria Funai.
O MPF requer ainda que a Funai, ao emitir a Declaração de Reconhecimento de Limites da Terra Indígena Kaxixó, e o Incra, no procedimento de análise de sobreposição realizada pelos servidores credenciados no Sigef, considerem os termos do RCID dos Kaxixó. Também é requerido que o Incra, como gestor do Sigef, providencie, no prazo de 24 horas, os meios técnicos necessários para tanto.
Retrocesso – Para o MPF, a norma incentiva conflitos fundiários em terras indígenas, porque permite que posseiros tenham declaração emitida pela própria Funai de que os limites de determinado imóvel não estão dentro de uma terra indígena, mesmo que se localizem em áreas reivindicadas por indígenas, em processo de delimitação e demarcação. Ao desconsiderar por completo as terras indígenas delimitadas, as terras indígenas declaradas e as terras indígenas demarcadas fisicamente, além das terras indígenas interditadas, a IN 09/2020 representa grave retrocesso na proteção socioambiental e no reconhecimento dos direitos territoriais dos povos originários.
Para os procuradores da República Edmundo Antonio Dias e Helder Magno da Silva, que assinam a ação, “tal cenário evidencia o grave risco causado pela insegurança jurídica gerada pela IN 9, já que territórios tradicionais estarão abertos à exploração ilegal e, principalmente, a negócios jurídicos, sem informação quanto à sobreposição com terras indígenas”.
Kaxixós – Em relação aos Kaxixó, o procedimento demarcatório do território de regularização, ainda não concluído, foi iniciado em 1993 e culminou no Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Kaxixó, cujo resumo foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) em 26 de março de 2013. A terra indígena, portanto, encontra-se identificada e delimitada com 5.411 hectares. Mas a IN 09/2020 permite que, com sua exclusão do Sigef e do Sicar, proprietários de imóveis rurais que estejam sobrepostos com o território indígena Kaxixó, que, vale dizer, é bem imóvel da União, poderão obter declarações do Sigef sem essa informação, criando incomensurável risco não só para os indígenas e para o meio ambiente, como, até mesmo, para os negócios jurídicos que envolvam tais bens.
(ACP 1021164-50.2021.4.01.3800-Pje)
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