Apesar das tragédias ambientais presentes em todo país, movimentos e cidadãos vinculados à causa ambiental têm o que comemorar em Minas Gerais. No final do mês passado, a Justiça Federal concedeu decisão favorável à preservação da Serra do Rola Moça, alvo de projeto minerário. Porém, a mineradora tem outro potente meio para conseguir sua pretensão: a política.
O Rola Moça é uma unidade de conservação importante ao abastecimento hídrico de Belo Horizonte e cumpre outras relevantes funções ecológicas. Desde o ano passado, o ímpeto da Mineração Geral do Brasil (MGB) para minerar na localidade cresceu. Pode explicar isso as atuais altas do dólar alinhada ao maior apetite dos asiáticos por minérios, fatores que tornam ainda mais lucrativa as atividades minerárias. A Vale, por exemplo, está logrando faturamentos recordes, conforme seus últimos resultados financeiros.
História da decisão
Em março de 2020, a MGB informou à Agência Nacional de Mineração (ANM) a não estabilidade de uma de suas barragens na Mina de Casa Branca, em Brumadinho. Essa barragem é localizada no Rola Moça. Paralelamente, a mineradora entrou com uma ação na Justiça Federal solicitando autorização para descaracterizar essa mesma barragem. Ou seja, desmontar a estrutura retirando dela os rejeitos. A Justiça concedeu liminar em agosto de 2020, mas revogou a decisão e encerrou o processo na semana passada.
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O juiz federal Ricardo Machado Rabelo reviu o deferimento anterior por dois motivos. Primeiramente, mediante a ANM ter atestado em fevereiro deste ano a estabilidade da barragem, o que não justificaria o descomissionamento. Segundo, por causa da ausência das devidas análises dos impactos socioambientais ocasionados pela descaracterização. Cabe recurso à decisão.
De acordo com ambientalistas a intenção real da MGB seria usar a decisão de 2020 para minerar na região. Moradores próximo à Casa Branca confirmam essa tese, embora não possuam provas. Vera Baumfeld, uma das fundadoras do movimento Rola Moça Resiste, afirma que “visualmente a barragem [alvo do descomissionamento] continua intacta”.
“Isso nos possibilita pensar que retiraram material para transportar de outro local”, afirma. Ainda segundo ela, o movimento solicitou visita técnica para as autoridades, por meio de uma queixa crime à Polícia Ambiental em 15 de fevereiro. “Nada foi feito até o momento”, alegou.
De acordo com informações do Blog Lei.A, na solicitação à Justiça Federal a MGB argumentou que não poderia esperar a morosidade dos órgãos ambientais estaduais para a autorização do descomissionamento, em razão da suposta instabilidade da barragem. Por isso pedia diretamente ao Judiciário.
Insistência da mineradora
A mineradora ainda tenta na Secretaria de Meio Ambiente estadual autorização para retomar sua atuação no Rola Moça. A empresa já atuou no local. O licenciamento em questão trata de atividades minerárias, não sobre descaracterização de barragens.
Em outubro de 2020, o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) se reuniu para decidir a respeito do licenciamento de mineração da MGB. Ela utilizou o veredito da Justiça Federal como argumento para ganhar a licença do colegiado. Do ponto de vista jurídico, isso não poderia ter ocorrido porque o desmonte das barragens não tem pertinência legal com o licenciamento, cuja análise na reunião do Copam foi barrada pela justiça, após provocação de uma Ação Popular.
“Em termos jurídicos tudo está a favor do meio ambiente. Há uma robustez na sentença. Mas, sabemos que estamos em um país complicado politicamente. O governo estadual e o federal trabalham contra o meio ambiente. Isso nos deixa assustados”, desabafou Vera, do Rola Moça Resiste.
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Ela também destaca o papel crucial que o movimento teve. “Foram manifestações e muitas articulações, que mesmo sem serem presenciais foram muito efetivas”, avalia. Houve dias em que o movimento chegou a impedir a passagem de caminhões da MGB no parque. A articulação foi exitosa a ponto de o Rola Moça Resiste conseguir espaço na mídia hegemônica, avessa às pautas como a da unidade de conservação. “Mesmo assim devemos continuar vigilantes”, completa.
Compartilha da opinião de Vera o presidente da Ecoavis Adriano Peixoto. “A vigilância deve continuar porque sabemos que existem outros caminhos para a empresa poder conseguir o quer”, opinou.
Ainda na semana passada, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais concedeu uma decisão anulando um processo que a Ecoavis e o Instituto Guaicuy haviam protocolado em 2018. As entidades pediam a extinção de qualquer proposta de mineração na serra. A Corte, porém, anulou o processo alegando que a competência para análises de tais casos é da Secretaria de Meio Ambiente. Os autores entraram com outra ação buscando a proibição de mineração no Rola Moça bem como o fechamento da Mina.
Decisões políticas
A depender do histórico na política mineira há razões para a vigilância não diminuir. O Brasil de Fato MG já noticiou que a MGB realizou lobby na Assembleia de Minas em prol do licenciamento pretendido.
O parlamento ainda protagonizou grandes escândalos envolvendo redução de áreas de unidades de conservação a serem destinadas à mineração. O mais recente caso foi o da Gerdau. Um deputado estadual elaborou projeto para beneficiar diretamente a empresa em detrimento da preservação da Serra da Moeda.
Ocorreu em 2018 situação semelhante com o parque de Arêdes, cuja área foi reduzida pelos parlamentares com a conivência do então governador Fernando Pimentel (PT). Por coincidência ou não, ao redor do parque havia a presença de mineradoras. Também emblemático foi o aval do Copam em 2018 à continuidade das atividades na barragem Córrego do Feijão, desabada em janeiro de 2019 matando 272 pessoas.
Atualmente, Zema se alinhou ao polêmico projeto minerário chinês no Norte de Minas. Na esfera federal, Bolsonaro assinou projeto que permite mineração em terras indígenas.
Edição: Larissa Costa