Manifesto contrário ao Decreto 10.935 de 12 de janeiro de 2022 e solicitação de sua revogação imediata

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a partir de análise efetuada por seu Grupo de Trabalho de Meio Ambiente, manifesta sua posição contrária ao Decreto 10.935, publicado em 12 de janeiro de 2022 no Diário Oficial da União (https://www.in.gov.br/web/dou/-/decreto-n-10.935-de-12-de-janeiro-de-2022-373591582), que revoga os Decretos anteriores, 99.556 de 1990 e 6.640 de 2008, já controversos em termos de conservação das cavernas e sistemas subterrâneos como um todo. O Decreto 10.935 fragiliza ainda mais os principais mecanismos de proteção das cavernas e sistemas geomórficos, bem como a biodiversidade associada composta por inúmeras espécies endêmicas e raras, possibilitando impactos irreversíveis em cavidades de grau de relevância máximo, através de autorização pelos órgãos ambientais e cumprimento dos requisitos por parte do empreendedor. Anteriormente, as cavidades naturais subterrâneas com grau máximo e suas respectivas áreas de influência eram protegidas destes impactos.

Interesses econômicos e a possibilidade de exploração de recursos minerários presentes nesses ecossistemas são as principais ameaças atuais, que podem ser ampliadas e viabilizadas por meio deste Decreto. A preservação das referidas cavidades é de suma relevância para a conservação de espécies raras, além da preservação de recursos hídricos e bens associados ao potencial turístico e recreativo, além de valores etno-religiosos. As referidas cavidades são sistemas naturais únicos, e por isso com um elevado valor intrínseco.

O Decreto 10.935 ainda traz modificações diminuindo os atributos que definem a relevância máxima de uma cavidade. Antes, com base no Decreto 6640 de 2008, eram considerados 11 atributos, dos quais, quatro eram biológicos. No presente decreto 10.935 foram retirados os seguintes atributos: i) morfologia única; (ii) isolamento geográfico; (iii) hábitat essencial para preservação de populações geneticamente viáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relícto; (iv) interações ecológicas únicas; (v) cavidade testemunho.

Outro retrocesso decorrente do recente Decreto é a modificação do formato de compensação ambiental quando houver impactos irreversíveis. No Decreto 6640 de 2008 considerava-se que cavernas de alta relevância, impactadas (ou suprimidas/destruídas), deveriam ser substituídas por outras duas similares em litologia, contexto histórico e ambiental. No atual Decreto o empreendedor poderá apresentar compensação com apenas uma cavidade, independente da litologia, considerando ainda o mesmo peso para a de relevância máxima.

Cabe ressaltar que cavidades são parte de sistemas geomórficos e paisagens, contando histórias acerca da evolução destas áreas por meio de sua litologia e inscrições rupestres, por exemplo. Quando há impactos em cavidades, há possibilidade de perdas de qualidade ambiental e prejuízos irreparáveis à biodiversidade e a recursos imprescindíveis como água para abastecimento. Desta forma, é necessário o aumento do grau de proteção incluindo cavidades de relevância máxima em unidades de conservação, ampliando a preservação dos recursos associados à biodiversidade, à água, a minérios e recursos arqueológicos presentes nesses ecossistemas.

O Decreto depende de uma normativa que irá definir a categorização das cavidades. Esta normativa deve ser publicada em até 90 dias a contar da sua publicação, entretanto, os atores que irão auxiliar nessa normativa não estão definidos e explicitados.

Neste sentido, a SBPC, por meio do seu Grupo de Trabalho em Meio Ambiente, recomenda fortemente a revogação do Decreto 10.935, com retorno da vigência do Decreto Federal 99.556/1990, e a inclusão de cientistas e pesquisadores ligados à área do conhecimento em discussões que venham a ser estabelecidas acerca das cavidades nacionais.

Veja a nota em PDF.

SBPC