Os Auditores-Fiscais do Trabalho resgataram 23 trabalhadores quilombolas, sendo 18 oriundos de comunidades quilombolas dos municípios de São Francisco e Chapada Gaúcha e cinco do interior da Bahia, dentre eles, dois menores de idade, em fazenda de desmatamento para cultivo de sementes para formação de pastagem próxima ao Parque Nacional Grande Sertão Veredas, em Minas Gerais. A operação foi deflagrada, no dia 6 de junho, a partir de denúncia de provável existência de trabalhadores em condições análogas às de escravo. Participaram ainda da ação representantes do Ministério Público do Trabalho e agentes da Polícia Rodoviária Federal.
De acordo com relatos apurados pela fiscalização do trabalho, as vítimas foram aliciadas por um “gato” contratado pelo proprietário da fazenda e alojados em uma edificação em ruínas às margens de uma estrada de terra que dava acesso à propriedade rural. O local era de difícil acesso, distante 50 quilômetros da cidade mais próxima e desprovido de qualquer meio de transporte que pudesse garantir a liberdade de locomoção dos trabalhadores, inclusive para buscar atendimento médico.
As vítimas laboravam sem registro em carteira e tinham os salários retidos até a data de término das atividades. Alguns deles relataram que estavam há mais de cinco meses no local sem receber salários ou ir até a zona urbana.
Os Auditores-Fiscais apuraram que o empregador mantinha uma pequena mercearia no local e praticava preços acima do mercado, além da venda de equipamentos de proteção individual, fumo e bebidas alcóolicas aos trabalhadores, inclusive aos menores, o que é vedado pela legislação. Este mecanismo de endividamento com a venda de produtos é conhecido como sistema de “barracão” e foi apelidado pelos trabalhadores de “robal”.
Moradia degradante
A edificação que habitavam, até então abandonada e em estado de ruínas, não possuía energia elétrica suficiente, somente uma placa solar que garantia o funcionamento de algumas lâmpadas, e não havia qualquer sistema de tratamento de água, que era coletada na sede da fazenda e armazenada em um caminhão pipa. No local não havia banheiros, os trabalhadores faziam as necessidades fisiológicas nas proximidades do alojamento e tomavam banho com o uso de baldes e canecos em água esquentada na lenha.
As refeições eram preparadas em local improvisado no terreiro, sem as mínimas condições de higiene. Os quartos eram destituídos de portas e nas paredes laterais havia frestas e buracos que permitiam a entrada de sujidades e até mesmo animais. Durante a inspeção, a equipe flagrou algumas galinhas andando por sobre as camas e pertences dos trabalhadores, que não tinham como isolar os dormitórios.
Frente de trabalho
As frentes de trabalho apresentavam condições de degradação. O ônibus que fazia o transporte até as frentes de trabalho estava em péssimas condições de manutenção e era conduzido por um dos menores de idade. Os facões utilizados no corte de galhos eram transportados no interior do veículo, junto aos trabalhadores, gerando riscos de graves lesões por corte em eventual ocorrência de acidente ou movimentação brusca do veículo.
Os empregados tinham que adquirir os próprios equipamentos de proteção individual e ferramentas de trabalho. Também não havia banheiros, fazendo suas necessidades fisiológicas no mato. Não havia sistema de reposição de água para consumo em uma atividade que exige grande esforço dos trabalhadores.
Cidadania
Os Auditores-Fiscais resgataram os trabalhadores e efetuaram o pagamento das verbas salariais e rescisórias, no dia 14 de junho, que totalizaram cerca de R$ 111.000,00. As vítimas também receberam guias de seguro-desemprego especiais que conferem a eles três parcelas do benefício e tiveram garantido o retorno aos seus locais de origem. Relatório da ação fiscal será encaminhado ao Ministério Público do Trabalho e Ministério Público Federal para adoção de medidas que avaliarem cabíveis no âmbito de suas competências.