Mineradoras Santa Paulina e Minar insistem em devastar Ibirité e Itabirito

20/07/2023

Foto do município de Itabirito - Créditos: Arthur Seabra/ Prefeitura de Itabirito

Fonte:https://www.brasildefatomg.com.br/rascunho/30e3aec5-6b50-4ea3-b384-7343da646fc0

Após 30 horas de viagem de ônibus de Belo Horizonte a Rondonópolis, no Mato Grosso, estamos aqui no primeiro dia do 15º Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), com o tema “CEBs: igreja em saída na busca da vida plena para todos e todas” e o lema “Vejam! Eu vou criar novo céu e uma nova terra”, com cerca de 1.500 representantes de CEBs de todo o Brasil.

Estou longe fisicamente de Minas Gerais, mas com o coração está em muitas lutas por justiça socioambiental nas minas e nos gerais. Partilho abaixo dois manifestos que foram escritos de forma coletiva, com minha participação, na esperança de que sejam instrumentos para ampliar a rede de apoio às lutas justas, necessárias e urgentes para que o município de Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, seja de fato território livre de mineração.

E para que o povo do município de Itabirito, no colar metropolitano da capital mineira, já tão sacrificado pela mineração devastadora, não permita a insanidade de aceitar a mineração dentro da Estação Ecológica de Arêdes.

Leiam abaixo e divulguem, por favor.

 

1. Manifesto pelo fechamento da mineração Santa Paulina na Serra do Rola-Moça em Ibirité, divisa com Sarzedo e Belo Horizonte

O Parque Estadual da Serra do Rola-Moça (PESRM), situado nos municípios de Belo Horizonte, Brumadinho, Ibirité e Nova Lima, MG, com seus 3.941,09 hectares de área, é o terceiro maior parque em área urbana do Brasil. Criado através do decreto estadual nº 36.071, de 27 de setembro de 1994. É considerado área de proteção especial de mananciais, essenciais para o abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Abrange, em seus domínios, várias nascentes e cabeceiras de rios, destacando-se as Áreas de Proteção Especial (APEs): Taboões, Rola-Moça, Bálsamo, Barreiro, Mutuca e Catarina, mananciais que abastecem parte da população de Belo Horizonte, Ibirité e Brumadinho. Adjacente ao PESRM, a Estação Ecológica de Fechos (EEFechos), um importante remanescente florestal, também um importante manancial de água que abastece a cidade de Belo Horizonte. A grande variedade de ecossistemas encontrados nesta região, contendo formações vegetais tanto da Mata Atlântica, quanto do Cerrado e de campos de altitude, faz com que a mesma seja dotada de uma extraordinária riqueza natural peculiar, que sofre violentas pressões tanto pela exploração mineral quanto pela alocação de empreendimentos imobiliários, em seu entorno. Preservar o PESRM se tornou uma necessidade para a sobrevivência de quase 6 milhões de pessoas da RMBH e de uma riquíssima biodiversidade.

A extração de minério na área do PESRM começou em 1937 com a concessão de lavra ao Departamento Nacional de Produção, tendo funcionado até o final dos anos 2000 com base nas famigeradas Autorizações Ambientais de Funcionamento quando foram interditadas por força de ação ajuizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG). Desde então a Mineração Santa Paulina levou 7 (sete) anos para que ao final tivesse em 2021 indeferido seu pedido de Licença Ambiental para voltar a explorar minério na Mina da Boa Esperança localizada entre Ibirité e Sarzedo, por evidentes razões de inviabilidade ambiental.

Com as atividades minerárias paralisadas em razão da ausência de licenças ambientais necessárias, a Mineração Santa Paulina, embora tenham sido comprovadas operações ilegais nesse período, terminou reduzindo a área a um cenário de destruição – crateras brutais – que permanece há anos sem adoção das medidas de recuperação necessárias. Em nova tentativa de operar legalmente na área, a Mineração Santa Paulina buscou licenciar então a atividade de reaproveitamento de bens metálicos dispostos em pilha estéril ou rejeitos, pedido que teve sua rejeição recomendada por extenso parecer emitido pelo setor técnico da Superintendência Regional do Meio Ambiente (Supram) da Secretaria de estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).

Entretanto, de maneira incompreensível e absurda o Superintende do órgão resolveu autorizar a retirada de mais de 1 milhão de toneladas sem qualquer tipo de licenciamento ambiental. A retomada das atividades minerárias pela Mineração Santa Paulina causou grande comoção popular, indignação e reinvindicações pelas comunidades atingidas com diversas representações dirigidas ao Ministério Público de Minas Gerais, apontando os múltiplos e brutais impactos negativos, danos ambientais e atividades poluidoras, decorrentes da retomada da retirada de minério e escoamento da produção através do trânsito de veículos de transporte da Mineração Santa Paulina em estrada clandestinamente aberta e em estreitas estradas de terra que interligam os municípios de Ibirité e Sarzedo, causando múltiplos e violentos danos às comunidades lindeiras aos trechos trafegados, especialmente centenas de famílias horticultoras. Inicialmente estão previstas 120 (cento e vinte) viagens diárias com pesados caminhões passando a cada 6 (seis) minutos, das 6h às 18h.

Diante dessa concreta e gravíssima ameaça ao Parque Estadual da Serra do Rola-Moça e a seus mananciais de abastecimento público, aos ecossistemas e ao bem-estar das populações atingidas, a produção de alimentos que alimenta a inteira região metropolitana de Belo Horizonte, o Ministério Público de MG ajuizou a Ação Civil Pública 5009765-16.2023.8.13.0114 que tramita perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Ibirité. Dentre várias razões exposta pelo Ministério Público de MG (MP-MG), destaca-se que a Fazenda Boa Esperança, onde se encontra a Mineração Santa Paulina, situa-se na zona de amortecimento do Parque Estadual Serra do Rola-Moça, nos limites de área de Conservação e Proteção Integral, afirmando que o empreendimento minerário da Mineração Santa Paulina “provoca e provocará impactos negativos, correspondendo, fundamentalmente, à ocupação dos espaços naturais, com prejuízos inevitáveis à fauna e à flora”, porquanto que o empreendimento minerário não conta com licenciamento ambiental clássico, precedido de estudo de impacto ambiental e de relatório de impacto ambiental (EIA e Rima).

Assim o Ministério Público de MG exige como pertinente ao caso, a) a imediata suspensão de todas as atividades desenvolvidas pela Mineração Santa Paulina; b) a abstenção de promover qualquer intervenção no Parque Estadual da Serra do Rola-Moça e/ou no seu entorno/zona de amortecimento; c) a abstenção de transitar caminhões e transportar minério (ou materiais afins), especialmente no entorno do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça (incluindo a sua zona de amortecimento); d) recuperação de todas as áreas degradadas e alteradas no empreendimento, por meio da elaboração, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, e ulterior execução de Plano de Fechamento de Mina (Pafem) ou Plano de Recuperação de Área Degradada (Prad); d.1) O Pafem/Prad deve contemplar a efetiva, integral e definitiva reparação ambiental da área onde foram desenvolvidas as atividades minerárias, sendo elaborado por equipe técnica com ART e contando cronograma de execução a ser rigorosamente seguido. d.2) O referido Pafem/Prad não poderá contemplar quaisquer medidas que impliquem em lavra de minério existente na área do empreendimento; e) a adoção de todas as medidas emergenciais e de segurança aptas a assegurar a estabilidade de todas as estruturas existentes no empreendimento minerário – nas crateras -, enquanto elas existirem, inclusive daquelas estruturas cuja operação será paralisada, devendo, ainda, ser garantida a neutralização de todo e qualquer risco à população e ao meio ambiente natural, cultural e artificial; f) a contratação, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, de auditoria técnica independente com reconhecida expertise, para o acompanhamento das medidas de recuperação das áreas degradadas e garantia de segurança das estruturas do local, sem prejuízo do cumprimento da legislação no tocante à realização de auditorias ordinárias e extraordinárias e da apresentação dos relatórios previstos em normas específicas e/ou solicitados por órgão competente; g) a observância das recomendações e adoção das providências recomendadas pela equipe de auditoria técnica independente e pelos órgãos competentes, nos prazos assinados, que objetivem a integral recuperação da área do empreendimento; h) no prazo máximo de 30 (trinta) dias, elabore um plano de comunicação com a comunidade, a fim de que as intervenções ocorram de forma transparente com a população diretamente afetada. Todos os trabalhos deverão passar pelo crivo dos órgãos de Estado/Município competentes, no que aplicável. Requereu também o Ministério Público, ainda, cautelarmente, com o objetivo de assegurar a integral reparação de danos, o bloqueio do valor de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais) em contas de titularidade da Mineração Santa Paulina.

A Juíza Renata Souza Viana postergou a análise da tutela de urgência conforme descrito acima para após a realização da Audiência de Conciliação, que ocorrerá de forma presencial, na quinta-feira, dia 20/07/2023 às 17h, em Ibirité, MG, razão pela qual é imprescindível a manifestação por escrito por meio de notas próprias de Movimentos Sociais e Organizações de Defesa dos Direitos Humanos, sociais e ambientais a serem encaminhadas ao Ministério Público e à juíza do caso, mas também pela presença no momento da Audiência de Conciliação, de entidades, movimentos socioambientais, coletivos de luta por direitos, lideranças dos âmbitos ambiental, social, cultural, religioso e político. Haverá Ato Público na Praça do Fórum em Ibirité, MG, dia 20/07/23, a partir das 14h. Convocamos a quem puder ir participar.

Este Manifesto pelo Fechamento da Mineração Santa Paulina na Serra do Rola-Moça é destinado a colher assinaturas de todas as pessoas preocupadas com as ameaças de morte ao Parque Estadual Serra do Rola Moça e a seus Mananciais de Abastecimento Público, fundamentais para a vida e o bem estar de todos os quase 6 milhões de pessoas da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Derrotar o projeto de devastação da Mineração é agora mais urgente do que nunca!

2 – Manifesto da rede de proteção da Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito: repudiamos com veemência o PL 387 que visa minerar em Arêdes

Nós, representantes da Sociedade Civil, amigos/a e Rede de Apoio da Estação Ecológica Estadual de Arêdes (EEA), em Itabirito, MG, vimos à presença de Vossa Excelência e aos Excelentíssimos (as) Senhores (as) Secretários(as) de Estado e Deputados(as) Estaduais de Minas Gerais, à Senhora Diretora Geral do IEF e ao Ministério Público Estadual expressar a nossa grande indignação quanto às graves consequências da proposta presente no Projeto de Lei 387/2023 que propõe alterar (desafetar) os limites da Estação Ecológica de Arêdes. Esse brutal, violento e injusto PL 387 visa possibilitar que áreas de relevante importância para os objetivos de criação desta Unidade de Conservação sejam destinadas a exploração minerária, atendendo à ganância tão somente de uma empresa mineradora, a Minar, que tanto degradou a região no passado, desconsiderando os demais aspectos socioambientais, tão necessários para garantir o desenvolvimento sustentável no Estado de Minas Gerais.

Não obstante proporcionar uma significativa alteração da dinâmica da Estação Ecológica de Arêdes, criada pelo Decreto Estadual nº. 45.397 de 14 de junho de 2010, alterado pelo Decreto Estadual nº.  46.322 de 30 de setembro de 2013, com fundamento na Lei n°. 19.555 de 09 de agosto de 2011, este Projeto de Lei 387 retira uma grande e importante gleba da área original dessa relevante Unidade de Conservação, sem que os critérios técnicos tenham sido evidenciados e devidamente analisados e segundo a nossa percepção, sem que tenha havido maiores discussões com a sociedade. Essa alteração de limites gera inclusive, os seguintes graves conflitos:

1. Desafetação de cerca de 280 mil metros quadrados (cerca de 28 hectares) da bacia hidrográfica do Córrego do Bação (cabeceira do Alto Rio das Velhas), que alimenta nascentes que abastecem 80% da população da cidade de Itabirito. A água necessária para abastecimento humano sofrerá risco de ter sua bacia hidrográfica descaracterizada, sob a pena de se perder definitivamente um bem comum que já está escasso. A crise hídrica se agrava em uma progressão geométrica. Preservar as nascentes e os mananciais se tornou uma necessidade para a sobrevivência da população. Não é aceitável, nem justo e ético que uma atividade econômica proponha explorar estas áreas;

2. A área onde a mineradora Minar pretende ocupar com sua escavação e demais estruturas formará um obstáculo linear de pelo menos mil metros, o que inviabilizará definitivamente o Corredor Ecológico que hoje liga as bacias do rio Paraopeba e rio das Velhas, prejudicando diretamente um dos objetivos de criação do Monumento Natural Estadual da Serra da Moeda. Um corredor ecológico integra porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recuperação de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais.

3. Destruição do último campo ferruginoso que restou protegido na Serra de Itabirito. Este campo nativo, que está em alto grau de conservação, é considerado Zona Primitiva da Estação Ecológica sendo essencial para o desenvolvimento de pesquisas, guarda um remanescente embrionário formado a 60 milhões de anos e indispensável para propiciar a recuperação das áreas exploradas pelas mineradoras do entorno (mineradoras Vale S/A, Gerdau, SAFM e Herculano). Para o conjunto de características naturais relevantes da Estação Ecológica de Arêdes, este campo nativo mantem a representatividade dos ecossistemas que antes existiam no quadrilátero ferrífero e aquífero, e na Serra de Itabirito especificamente, e hoje caminham aceleradamente para a extinção. Será a nossa geração a última a poder ver este ecossistema na natureza? O PL 387, se for aprovado, devastará tudo isso.

4. Redução do valor cultural e paisagístico do Complexo Arqueológico de Arêdes, pela sua fragmentação e destruição de estruturas componentes. Trata-se de Complexo Histórico-Arqueológico oriundo do séc. XVIII composto por conjuntos e unidades isoladas (casas, capela, muros, currais, casa de fundição, canais, catas antigas, dentre outros), confeccionados em alvenaria de pedra, portanto, exemplar raro da arquitetura vernacular mineira, com acabamentos variados, compostos por blocos de canga e ou de quartzito em cantaria. Quem irá querer conhecer um patrimônio em local onde também estará acontecendo a exploração minerária com todos seus impactos, barulhos, poeiras e riscos? Como este patrimônio poderá fruir para nossa sociedade? Hoje a Estação Ecológica pode receber escolas e demais visitantes, no entanto, este PL 387 prevê que, à montante das áreas propícias para visitação e passeios escolares, estará uma atividade com tantos parâmetros de segurança a serem atendidos devido ao grau de risco elevado da atividade. Isto não pode ser conciliado. Não aprendemos nada com os crimes brutais e hediondos das mineradoras em conluio com o Estado em Bento Rodrigues/Mariana e em Brumadinho, que afetaram drasticamente as bacias dos vales dos rios Doce e Paraopeba? Quantos outros crimes cada vez mais brutais deixaremos acontecer com a ação devastadora das mineradoras?

5. Estamos em um momento de transição, os governos e populações das cidades mineradoras buscam a diversificação econômica e a possibilidade de se desenvolver de forma limpa. Os municípios e as comunidades precisam com urgência se libertarem da mineriodependência que escraviza e superexplora o povo e os ecossistemas cada vez mais. Não é possível mais que uma atividade econômica impeça o desenvolvimento de outras. Assim como o Distrito de São Gonçalo do Bação, o Monumento Natural da Serra da Moeda, a Serra do Curral e a nossa Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito e tantos outros bens potenciais para o turismo e com seu valor intrínseco devem ser leoninamente defendidos, por nós que nos importamos com nossa terra.

Assim sendo, apelamos a Vossas Excelências que arquivem definitivamente o Projeto de Lei 387, que se for aprovado, abrirá caminho para brutal devastação da Estação Ecológica de Arêdes e sacrificará nascentes e córrego que estão na cabeceira do rio das Velhas e comprometerá inclusive o abastecimento público de Belo Horizonte e Região Metropolitana. A mineradora Minar já degradou de forma brutal esta região no passado. O PL 387 só gerará lucro e acumulação de capital para a mineradora Minar e retirará dos nossos descendentes o restante deste precioso bem cultural, histórico, arqueológico e natural, que temos a obrigação de proteger, como Coletividade. O Governo de Minas Gerais e os deputados/as também têm a obrigação de garantir a preservação da Estação Ecológica de Arêdes. Pelo expresso acima, repudiamos com veemência o PL 387 e exigimos o seu arquivamento. Fora, PL 387/23 que atende a lobby da mineradora Minar e outras mineradoras.

 

 

Gilvander Moreira é frei e padre da Ordem dos Carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em filosofia pela UFPR; bacharel em teologia pelo ITESP/SP; mestre em exegese bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CebiI e das ocupações urbanas; professor de teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica).

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

 

 

Edição: Larissa Costa

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