24/01/2024
Repudiamos veementemente as inúmeras depredações e pichações ocorridas em abrigo rochoso com figurações rupestres pré-coloniais e demais testemunhos históricos e arqueológicos na Lapa da “Mendanha de Curralinho” – lugar de memórias e importante patrimônio cultural da região de Curralinho (Extração), município de Diamantina, MG.
Moradores de Curralinho denunciaram as inúmeras pichações feitas no abrigo arqueológico composto por vários conjuntos de figurações rupestres pré-coloniais. No âmbito da proteção legal basilar a respeito do patrimônio arqueológico, onde se enquadra o Abrigo Arqueológico “Mendanha de Curralinho”, a Constituição Federal, promulgada em 1988, determina nos artigos 20 e 216 que os bens de natureza material e imaterial, incluindo os sítios arqueológicos, são de forma indubitável “bens da União Federal”.
“Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores de referência à identidade, à ação, à memoria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem: (…) V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.”
Como mencionado, todos os sítios arqueológicos pré-coloniais e/ou históricos”, são protegidos pela Lei Federal n. 3.924, de 1961, que já possui mais de cinquenta anos de vigência, e que vem sendo desde então o principal instrumento de salvaguarda e de proteção específica deste tipo de bem cultural no país.
“Art. 1- Os monumentos arqueológicos ou pré-históricos de qualquer natureza existentes no território nacional e todos os elementos que neles se encontram ficam sob a guarda e proteção do Poder Público, de acordo com o que estabelece o art. 175 da Constituição Federal.”
No artigo 5, considera crime a destruição e a mutilação deste tipo de patrimônio, que incorrem em infrações sujeitas a penalidades conforme o Código Penal.
“Art. 5 – Qualquer ato que importe na destruição ou mutilação dos monumentos a que se refere o art. 2 será considerado crime contra o Patrimônio Nacional e, como tal punível de acordo com o disposto nas leis penais.”
Novos instrumentos jurídicos foram posteriormente elaborados de maneira a operacionalizar e assegurar a preservação do Patrimônio Arqueológico e Cultural. Nessa esteira protecionista a Lei n. 9.605, de 1998, também conhecida como “Lei de Crimes Ambientais”, estabeleceu em sua Sessão IV intitulada: “Dos Crimes Contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural” penalidades no que se refere à danificação de bens culturais e arqueológicos, merecendo aqui ser destacado o artigos 63.
“Art. 63- Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de valor paisagístico, ecológico, turístico, ecológico, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena-reclusão de um a três anos e multa.”
Nas Cartas Internacionais Patrimoniais elaboradas em Conferências promovidas por organismos, tais como, o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), encontramos as bases conceituais e epistemológicas do aparato legal brasileiro, pois tais documentos foram os aportes na construção das leis, instruções, deliberações e condutas em geral dos países signatários no que se refere à política de proteção e à pesquisa patrimonial e arqueológica.
A região de Diamantina, Serro e arredores são munidas de inúmeros abrigos, escarpas, cavernas e chapadas rupestres munidas de sítios e testemunhos arqueológicos pré-coloniais e históricos (associados a atividades tradicionais de garimpo, tropeiros, viajantes, coleta de sempre viva, quilombos, moradias em geral da população tradicional). Trata-se de importante e típica relíquia do patrimônio cultural de toda essa região.
Tememos que este ato de vandalismo lamentável e criminoso em Curralinho possa se repetir em outros sítios e lugares de memórias da região, o que seria outra grande tragédia patrimonial, pois se trata de ambientes únicos e muito vulneráveis.
Aguardamos providências firmes e urgentes por parte do Ministério Público em âmbito federal e estadual, IPHAN, Prefeitura Municipal e Polícia Florestal.
Entende-se que se faz importante a realização de programas de mediação e de formação patrimonial, coibindo atitudes isoladas de degradação ambiental/patrimonial, mas que podem causar danos irreversíveis para toda uma coletividade, adulteração de memórias ancestrais e do patrimônio cultural de todos e de todas.
O CEDEFES se coloca à disposição para colaborar no sentido da proteção e da valorização patrimonial e das memórias dos povos e das comunidades tradicionais, sempre.
Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva – CEDEFES
Belo Horizonte, 24 de janeiro de 2024.