10/08/2023
Arcebispo metropolitano Dom Walmor Oliveira de Azevedo assinou, nesta quinta-feira (10), revogação de um aviso que proibia a manifestação religiosa afro-brasileira nas missas.
Após exatos 100 anos, o congado volta a ocupar as igrejas católicas de Belo Horizonte. Nesta quinta-feira (10), o arcebispo metropolitano Dom Walmor Oliveira de Azevedo assinou a revogação de um aviso que proibia a manifestação religiosa afro-brasileira nas missas.
“Venho publicamente reparar o referido aviso, pois a Igreja, seguindo os ensinamentos de Jesus Cristo, é promotora da vida, respeitando a cultura e a liberdade religiosa de cada povo”, diz o documento.
A proibição do reinado dentro das igrejas foi estabelecida em aviso publicado no dia 10 de agosto de 1923, por determinação do primeiro bispo da então Diocese de Belo Horizonte, Dom Cabral.
“É pensamento e desejo da autoridade diocesana que desapareçam os reinados, que os fiéis sejam bem instruídos sobre as vantagens da utilíssima devoção do rosário”, diz um trecho do aviso da diocese.
Diante da proibição, as irmandades passaram a construir seus próprios templos nas periferias, onde os cultos eram realizados em sigilo.
Mas, no ano passado, a rainha do Reinado Treze de Maio, Isabel Casimira, decidiu mudar essa história. Ela enviou uma carta ao Papa Francisco pedindo a revogação da decisão de Dom Cabral. O objetivo é resgatar o direito de homenagear, dentro das igrejas, Nossa Senhora do Rosário e santos protetores dos negros escravizados, como São Benedito e Santa Efigênia.
“A Nossa Senhora é de todo mundo, ela é uma grande mãe que acode todo mundo. Se a sua mãe é a mesma mãe minha, por que eu não posso falar da minha mãe na casa do meu irmão? […] Em respeito a essa luta, eu não posso deixar que os meninos que vão herdar essa nossa tradição não consigam fazer uma missa na igreja, se eles assim quiserem”, disse Isabel.
Rainha do Reinado Treze de Maio, Isabel Casimira — Foto: TV Globo/ Reprodução
Ela ainda aguarda uma resposta de Francisco, mas o apelo chamou a atenção da Arquidiocese de Belo Horizonte, que finalmente derrubou a proibição.
“Com certeza, o ato de hoje é de verdade uma reparação de algo que na história desumanizou uma parcela da sociedade”, afirmou o bispo auxiliar da Arquidiocese de BH, Nivaldo Ferreira.
Segundo o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), há 877 registros de festas e grupos de reinado ou congado em 281 cidades de Minas Gerais. O instituto considera essa “a manifestação cultural de maior destaque no estado, existente há mais de 300 anos”, que chegou ao Brasil por meio de negros africanos escravizados.
Para o padre Mauro Luiz da Silva, pároco da Paróquia Santo Afonso, o documento é muito importante, mas o processo de reparação histórica continua.
“A gente não muda uma estrutura racial racista de um dia para o outro, não é através de uma assinatura que isso vai mudar. É um processo longo”.