As evoluções ocorridas nas sociedades capitalistas centrais, nos mostram que a burguesia não só aprendeu a conviver com a luta de classes como ela foi mais longe; abatendo o próprio movimento socialista em primeiro lugar e logo depois o movimento comunista, forçando-os a definir como seu eixo político a forma burguesa de democracia, ou seja, forçou-os a renegar a luta de classes e os meios violentos, “não democráticos”, de conquista do poder.
Declínio impôs concepção burguesa de democracia
Enquanto o movimento socialista e o movimento comunista optaram por ações “táticas” e “defensivas”, a burguesia avançou estrategicamente, em nível financeiro, estatal e militar, procedendo a uma verdadeira “revolução das técnicas de contrarrevolução”; abrindo novos espaços para si própria, explorando as funções de legitimação do Estado para amarrar as classes trabalhadoras à segurança da ordem e soldar os sindicatos ou os partidos operários aos “destinos da democracia”.
Então, quais foram os erros que os sindicalistas, os socialistas, os anarquistas e os comunistas cometeram, em escala mundial, para serem exilados à condição de massa de manobra da burguesia? Bem, o que se vê, são consentimentos desleais e autodestrutivos. Ou seja, do abandono do internacionalismo proletário, passou-se ao social patriotismo, deste, ao abandono do aprofundamento da luta de classes e da revolução proletária, como se a ordem social competitiva pudesse chegar a um estágio de confraternização de classes sociais contrárias.
Atual democracia não resolve antagonismo entre as classes
A marcha da luta de classes oscilou e essas oscilações foram traduzidas, politicamente, no declínio mais ou menos prolongado do potencial da classe operária de bater-se pela vitória do poder, então, ela sucumbe-se no plano prévio de enfrentamento coma a hegemonia burguesa, incorporando inclusive a ideologia de classe da burguesia e sua forma de democracia, ela tem de esmorecer-se e de render-se ao poder do Estado.
As classes burguesas, ao se virem ameaçadas de expulsão, ou mesmo aniquilamento fizeram o que era coerente na situação revolucionária. Revigoraram ao máximo o cerne burguês da luta de classes e foram ao fundo na contrarrevolução, beneficiando-se, ao longo do processo, das novas revoluções tecnológicas e dos recursos que elas trouxeram ao fortalecimento do capitalismo, ao reaparecimento da opressão e ao aprimoramento da repressão.
Crise prolongada
Com isso, mostraram e comprovaram que o poder burguês não pode ser derrotado tão facilmente quanto o poder feudal e que o movimento socialista revolucionário precisa ser reajustado e se renovar para rever suas técnicas de revolução. Sendo assim, o cerne proletário da luta de classes entrou em queda, vindo a sofrer uma crise prolongada.
Nem a ótica socialista nem a ótica comunista souberam responder às exigências dessa situação. Portanto, de concessão em concessão, de penúria em penúria, as forças militantes perderam força, além da oportunidade histórica de salvar o “espaço histórico do proletariado”.
Vivemos uma época difícil, portanto, é essencial ler e reler O Manifesto do Partido Comunista; sabemos que o mundo para o qual ele foi escrito já não existe mais; no entanto, precisamos lê-lo e relê-lo em sua essência, pela seguinte razão: devemos agir para recuperar a verdadeira ótica do socialismo revolucionário e do comunismo. Marx, em “A Miséria da Filosofia”, expressa a diferença entre existência material da classe trabalhadora e a sua tomada de consciência, na luta de classes. Onde os polos da contradição são articulados pela luta de classes dos trabalhadores contra os gestores e os burgueses, luta essa que produz a tecnologia. A luta de classes é uma realidade e só desaparecerá se o capitalismo for destruído. O capitalismo só tem interesse no enfraquecimento e na destruição da luta de classes enquanto puder manter integralmente a forma capitalista de propriedade privada e de exploração do trabalho. Portanto, a volta ao Manifesto será, efetivamente, uma maneira de ressaltar a união do movimento socialista com o proletariado e com a revolução anticapitalista.
Utopia
É óbvio que não faltarão análises e convicções que mostrarão o “caráter utópico” do renascimento de uma autêntica consciência proletária dessa transformação. O que vemos, é a insistência no crescimento das classes médias, no estreitamento do setor proletário ou na predominância do trabalho intelectual que, sob a grande indústria ultramoderna, a “sociedade de massas” despolitiza a consciência e o comportamento ativo das classes oprimidas, como se, finalmente, as classes possuidoras e dominantes tivessem descoberto o seu paraíso, graças à civilização industrial recente.
A grande expectativa da Humanidade, quem sabe, estaria nos confins da periferia, entre os mais pobres e desprovidos de bem da Terra.
Burguesia avançou estrategicamente em nível financeiro, estatal e militar
As interpretações do revisionismo, do social patriotismo e do socialismo reformista mais ou menos íntegro vão defender a ideia de que a revolução proletária tornou-se, impossível, ou totalmente ou com pouca possibilidade de acontecer, sendo então, sua defesa, um absurdo político. Os que não gostam do capitalismo precisam aprender a conviver com ele, e torná-lo “mais benevolente”, através da dissidência inteligente e dos movimentos dotados de centros múltiplos de defesa comunitária de “qualidade de vida”.
Pois bem, o capitalismo é o que mais mata e enterra a qualidade de vida. Por onde ele passa, quaisquer que sejam os países, quer sejam superdesenvolvidos ou não, o efeito é sempre o mesmo; a destruição da qualidade de vida; que não passa de uma ilusão. A única defesa correta da qualidade da vida constitui uma função da destruição da civilização industrial capitalista; ou seja, ou a qualidade da vida se processa através do socialismo revolucionário, ou o movimento histórico em sua defesa nunca irá além de uma ilusão.
Democracia dos trabalhadores
A renovação dos ideais revolucionários do Manifesto, é claro que não poderá ocorrer como se estivéssemos no século XIX. A luta de classes para nós, marxistas é passível de várias adequações. O essencial é que ela não seja destruída ou sufocada, em nome de ludibriações, como a que a encerra no universo legítimo e tranquilo de defesa da forma burguesa de democracia. O caminho democrático conciliável com a luta de classes é o que se cria graças ao enfrentamento das classes operárias e oprimidas com as classes dirigentes e opressoras.
A mudança da soberania burguesa e a necessidade da conquista do poder exigem uma democratização antecipada extensa e intensa; de organização proletária, de autodefesa e de ataque. O que entra em jogo, portanto, não é ou democracia ou revolução proletária. Essa alternativa é falsa e desde que o proletariado tenha condições para se lançar ativamente ao incentivo da luta de classes, ele põe em igualdade histórica uma forma de política de democracia que as classes burguesas não podem endossar e realizar.
Classe trabalhadora incorporou ideologia de classe da burguesia
Isso nos mostra que não são os proletários e seus aliados que têm interesse em privarem-se das condições mais ou menos vantajosas em que podem travar a luta de classes sob o capitalismo monopolista e imperialista da era atual. Essa privação é imposta por meios opressivos ou sucessivos pelo ódio burguês.
O Estado democrático existente tem de destruir o movimento operário ou, pelo menos, impedir que ele lute por seus objetivos históricos centrais, porque a democracia burguesa não é bastante forte para conter os conflitos gerados pela produção capitalista e pelo desenvolvimento do capitalismo. Essa forma política de democracia não comporta o antagonismo da violência dos proletariados e oprimidos, porque esta extinguiria as bases econômicas, sociais e políticas da dominação burguesa, isto é, ela não pode conferir emancipação consonante a todas as classes sem se dissolver.
Por isso, não há como reformar o capitalismo de uma forma proletária. Para reformulá-lo, seria preciso eliminar todas as causas da desigualdade econômica, social e política, que existem e se reproduzem necessariamente sob o capitalismo, o que equivale dizer: compor na sociedade e nas civilizações capitalistas existentes, a forma histórica que a sociedade e a civilização tenderão a assumir graças e através do socialismo.
O engano dos “socialistas democráticos” são evidentes. A democracia burguesa de nossos dias é uma “democracia armada” e armada extremamente contra isso. A “democracia forte” possui as mesmas causas que o fascismo e busca os mesmos fins. Ela nasce do temor da burguesia diante da revolução proletária e pretende paralisar a história.
Univos
A linguagem e a mensagem do Manifesto permanecem atuais, pois, ele começa por uma síntese do desenvolvimento social da humanidade. Marx nos mostra que a história de todas as sociedades é a história da luta de classes. Até mesmo a burguesia conseguiu tomar o poder e implantar o capitalismo por meio de uma luta contra as instituições feudais. Sendo assim, todas as classes que chegaram no passado, a tomarem o poder, além de organizar a sociedade ao seu modo, eram, de um ou de outro modo, classes proprietárias.
No entanto, o proletariado que não possui nenhuma propriedade, somente tomará o poder na intenção de implantar um sistema baseado na propriedade social, coletiva. O que faz com que a burguesia tema a ascensão do proletariado.
Marx concluiu o Manifesto assim: “proletariados nada têm a perder a não ser as suas algemas. Têm um mundo inteiro a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos!”.
Antonio Manoel Mendonça de Araujo é professor de Economia, Conselheiro do SINDECON/MG e Ex-Coordenador da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED-MG).
Edição: Elis Almeida