Comitê em defesa da Palestina avalia o papel da população de MG na luta contra o genocídio

11/12/2024

Mulheres, idosos e crianças estão entre os principais alvos do exército israelense na Faixa de Gaza

Imagem: – JOÉDSON ALVES/ABR

Passado mais de um ano desde a intensificação do conflito na Faixa de Gaza, já são mais de 40 mil palestinos assassinados pelo genocídio de Israel. O dia 29 de novembro marcou a data Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino, comemorada desde 1977, sinalizando que a guerra promovida pelo exército israelense, com apoio e financiamento dos Estados Unidos, é mais antiga e profunda.

O Comitê Mineiro de Solidariedade ao Povo Palestino desenvolve ações para conscientizar a população de Minas Gerais sobre o genocídio em curso e a necessidade de defender uma Palestina livre.

Em outubro do ano passado, após os novos ataques na Faixa de Gaza, o coletivo se rearticulou e, desde então, vem promovendo protestos e atividades formativas sobre o tema na capital mineira.

Não é natural pessoas serem assassinadas por serem palestinas

Para entender melhor as raízes do conflito, quem são as principais vítimas do genocídio, qual é o papel dos Estados Unidos na guerra e quais são as tarefas da população mineira diante desse cenário, o Brasil de Fato MG conversou com representantes do comitê.

“Nossa primeira preocupação é não sair das ruas. O maior desafio é retirar a população da letargia, criar solidariedade e mostrar que não é natural pessoas serem assassinadas por serem palestinas”, destacam Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda.

Leia a entrevista completa:

Brasil de Fato MG – Explique as principais motivações do conflito entre Israel e Palestina.

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda –  A Palestina é hoje uma das últimas colônias do planeta. Sua condição colonial começou a ser construída ainda no século XIX, quando Theodor Herzl inaugurou o movimento sionista, com o seu livro “O Estado Judeu”, de 1896.

A Palestina foi eleita como território a ser ocupado pelo sionismo, quando esse movimento reivindicou uma pretensa “ancestralidade judaica milenar” naquela região. A consigna “uma terra sem povo para um povo sem terra” orientou esse movimento, mesmo que a Palestina fosse ocupada nos últimos 4 mil anos por diversos povos, em especial os árabes de origem palestina.

O senso comum construído pelo sionismo reivindica uma ancestralidade territorial judaica que justificaria a tomada da Palestina pelo chamado “povo escolhido”, misturando o projeto político colonial sionista com a reivindicação da religião judaica, o que é inverídico quando colocado sob análise histórica.

Maior desafio é criar solidariedade e retirar a população da letargia

A motivação principal do sionismo é concluir o seu projeto colonial na região e o movimento teve um considerável avanço após os horrores do holocausto, durante a 2ª Guerra Mundial. A questão de um Estado para os judeus sensibilizou a opinião pública mundial.

A ONU estabeleceu a partilha da Palestina em 1948, sem considerar a população palestina e a sua soberania territorial. Os países árabes também não aceitaram a partilha, declarando guerra contra a entidade sionista na região.

Os confrontos entre “Israel” e os países árabes reconfiguraram as fronteiras dentro e fora da Palestina, com o Estado sionista ampliando fortemente o seu território, para além das fronteiras estabelecidas pela ONU em 1948, e por meio de diversas guerras colonialistas.

Brasil de Fato – Qual é a relação entre o genocídio israelense contra o povo palestino e os interesses do imperialismo norte-americano?

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda – Os Estados Unidos tem amplo interesse na permanência da ocupação sionista na Palestina. A região do Oriente Médio concentra algumas das maiores reservas energéticas do mundo, em especial de petróleo e de gás natural.

É conhecida a declaração do então senador Joe Biden há algumas décadas, que afirmava que “se ‘Israel’ não existisse, precisaríamos criá-lo”. Hoje, a OTAN, criada para conter o avanço da influência da União Soviética no mundo e especialmente na Europa durante a Guerra Fria, tornou-se a principal ferramenta imperialista para garantir o monopólio mundial das fontes energéticas espalhadas nos cinco continentes.

Governo Lula (PT) precisa romper todas as relações com Israel

A presença de “Israel” na região, apoiado incondicionalmente pelos yankees, tem esse objetivo. Fica evidente que o Direito Internacional constituído no pós-guerra só vale para justificar ações militares de roubo e desestabilização de Estados não alinhados ao imperialismo estadunidense.

A Palestina é hoje o exemplo mais grave. “Israel” está isento de cumprir qualquer acordo internacional e de sofrer sanções pelos países imperialistas pelas suas práticas agressivas e desrespeitosas aos Direitos Humanos, seja na Palestina, seja em qualquer outro país.

Brasil de Fato – Na sua avaliação, o que diferencia a guerra contra o povo palestino em relação a outros conflitos?

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda – A principal diferença a ser observada no conflito entre “Israel” e a Palestina é a capacidade total que o sionismo possui para agir sobre a população e o território palestinos. Diferente de outras nações em guerra neste momento, “Israel” não respeita acordos internacionais consolidados nas últimas décadas, como o não uso de armas proibidas.

Há também ataques a posições civis, como escolas e hospitais; também impede o acesso a alimentos e à água potável pelos palestinos há décadas; não respeita os direitos das crianças palestinas, levando-as presas sob qualquer alegação e muitas vezes sem acusação formal; torturam palestinos sequestrados em suas casas e bairros e os fazem prisioneiros nas masmorras sionistas.

Os israelenses também criam modernos armamentos que são testados com a população palestina, para depois serem vendidos em feiras de armas pelo mundo com selos de “testado em campo” que valorizam os seus equipamentos.

Mesmo com sanções e boicotes renovados de tempos em tempos, nada foi suficiente para conter o genocídio do povo palestino, mesmo diante da cobrança de lideranças políticas e populares em diversos países.

Fica claro que, para “Israel”, fazer parte da “gangue” imperialista é fundamental para agir sem considerar consequências políticas. Isso é preocupante, pois abre uma nova etapa de conflitos no mundo, onde critérios basilares adotados pelos países membros da ONU estão ameaçados.

Brasil de Fato MG – Quem são as principais vítimas do conflito? 

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda – O genocídio tem o objetivo de eliminar a população palestina. Os ataques indiscriminados matam mulheres, crianças, idosos, pessoas doentes e homens, e destroem os espaços religiosos, hospitais, escolas e casas. Os israelenses têm como alvos prioritários as mulheres e as crianças.

As mulheres são mobilizadoras e guerrilheiras e, por serem mães, são capazes de gerar e educar pessoas. Essas pessoas, conhecendo e concordando com a causa palestina, se tornarão, provavelmente, novos combatentes.

O assassinato de mulheres por si só já é um absurdo. Mas, assassinar mulheres que sejam bisavós, avós, mães, irmãs, esposas, filhas, primas, tias, vizinhas, ou seja lá quem forem, aumenta e desenvolve a disposição para integrar a resistência política.

Eliminar crianças é estratégico para eliminar em médio e longo prazo a resistência Palestina. As crianças serão os jovens e adultos futuros,  participantes da resistência. Entre tantos vídeos chocantes que recebemos, há vários de soldados rindo e dizendo que gostam de matar mulheres grávidas, pois “tiram duas vidas com uma única bala”.

Brasil de Fato MG – Como têm sido as mobilizações populares em defesa da Palestina no Brasil e em Minas Gerais? Conte um pouco sobre a experiência do comitê mineiro.

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda – O comite já existe desde 1983 e é reativado quando, por alguma razão, o silenciamento acerca da violência sobre o povo palestino é quebrado. Foi assim, quando a resistência palestina quebrou o silenciamento em 7 de outubro de 2023 e tornou pública a fúria assassina de Israel.

Imediatamente, reativamos o comitê. Chamou-se uma reunião e organizamos a primeira manifestação já para o dia 11 de outubro de 2023. O ato reuniu centenas de pessoas, representando dezenas de entidades e independentes. Organizamos uma manifestação maior no dia 25 de outubro. Desde então, não paramos mais.

O Comitê Mineiro de Solidariedade ao Povo Palestinose se reúne toda segunda-feira, às 19h, em Belo Horizonte, no Sind-Rede, que fica na avenida Amazonas, 491, 10º andar. Nossos objetivos são sensibilizar a população mineira para os diversos crimes contra a humanidade  e  exigir do governo brasileiro uma atitude concreta.

Os posicionamentos públicos do governo são importantes, mas apenas “falas” são insuficientes frente à barbárie. É necessário o rompimento das relações diplomáticas, comerciais, militares, políticas e acadêmicas com o Estado sionista de Israel.

Nossa primeira preocupação é ocupar as ruas, que são o espaço próprio do povo.  O carnaval de 2023 em BH, por exemplo, com 5 milhões de pessoas, foi fortemente pautado pela causa palestina.  O Dia Internacional das Mulheres Trabalhadoras, comemorado no 8 de março, o Dia da Luta Antimanicomial, em 18 de maio, e o Grito dos Excluídos, no 7 de setembro, também foram palco de nossas lutas. Fizemos intervenções de enfrentamento em locais próprios da burguesia local.

Para garantir a unidade na diversidade, fizemos seminários, organizamos debates e lançamentos de livros com a participação de pessoas da luta internacionalista, como o jornalista Breno Altman e a coordenadora do Departamento de Saude Mental e Psiquiatria da Palestina e Cisjordânia Dra. Samah Jabr. Também trouxemos o presidente da Fepal Ualid Rabah e o militante internacionalista Thiago Ávila.

Brasil de Fato MG – Quais são os principais desafios para intensificar a luta em defesa do povo palestino?

Demian Cunha, Dirlene Marques e Thiago Miranda – O mundo inteiro está se manifestando e levando milhares de pessoas às ruas. No Brasil, as pesquisas têm mostrado que a solidariedade à Faixa de Gaza cresce. Ao mesmo tempo, essa solidariedade se manifesta nas mídias sociais, em discursos e em falas. Agora, com a expansão dos ataques de Israel para a Cisjordânia, no Líbano, Irã e Síria, cresce a indignação.

Essa indignação deve se refletir nas mobilizações de rua. Se fala muito na naturalização desses crimes, afinal já se passaram 400 dias em uma tragédia histórica e inaceitável. Estamos vendo corpos de bebês e de crianças aos pedaços, mutiladas, sendo atendidas no chão, sem medicamentos e morrendo de fome. Médicos sendo torturados e mortos nas prisões e jornalistas sendo assassinados enquanto fazem o seu trabalho fazem parte do cotidiano

Os mortos se transformaram em números. Não é o Mohammed, nem o Malik, nem o Samir, nem a Amina, ou Aisha, ou Ghada ou Samira. São 20, 300 ou 500 pessoas que são assassinadas em um único dia.

O maior desafio é retirar a população da letargia, criar solidariedade e mostrar que não é natural pessoas serem assassinadas por serem palestinas. Não é natural as pessoas morrerem de fome e de sede por falta de medicamentos porque Israel quer exterminar o povo palestino.

Sobretudo, precisamos nos mobilizar para que o governo Lula (PT) rompa todas as relações com Israel.

 

Edição: Elis Almeida

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