05/12/2013
Mariana Tokarnia, Repórter da Agência Brasil
Brasília – Índio não tem direitos. Índio é preguiçoso, não é nem gente. Esses pensamentos permearam o Brasil até bem pouco tempo. A declaração é do mestre em antropologia social, Tonico Benites, indígena da etnia Guarani-Kaiowá. Segundo ele, apenas em 1988, com a nova Constituição Federal é que os indígenas passam a ser considerados cidadãos. Os mais de 400 anos de exclusão impactam a vida dessa população até os dias de hoje.
Benites será um dos palestrantes do Fórum Mundial de Direitos Humanos, que acontecerá em Brasília de 10 a 13 de dezembro. Ele participará dos debates sobre o histórico do reconhecimento dos indígenas como detentores de direitos.
O Censo de 2010 mostra que quase 0,5% da população brasileira é indígena. São 896,9 mil de 305 etnias. Eles são responsáveis por 274 idiomas falados em território nacional, além do português.
“[Os indígenas] não vivem com qualidade, lutam para sobreviver. Lutam para ter comida, algo básico”, diz o antropólogo. A maior parte da população indígena não tem acesso à saúde ou a educação de qualidade. Segundo dados do Portal Brasil, são 105,7 mil alunos indígenas matriculados em turmas do primeiro ao quinto ano, o que representa 51,7% dos que estudam e menos de um oitavo do total da população. São 4 mil indígenas em cursos de licenciatura intercultural em 20 instituições públicas, o que corresponde a 0,44% dessa população.
Um dos grandes problemas enfrentados pelos indígenas é a demarcação de terras. Também de acordo com o Censo, foram identificadas 505 terras indígenas, que representam 12,5% do território brasileiro – 106,7 milhões de hectares -, onde residiam 517,4 mil indígenas (57,7% do total).
“Em dois dias passei por três territórios da etnia Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. Apenas uma dela é reconhecida e isso não faz diferença. Nas três não havia escola ou assistência à saúde”, descreve. “A legislação diz que esses serviços são direitos do cidadão. Não os encontrei nem mesmo no território já demarcado”. Os conflitos também são muitos, por posse de terra. Em duas das aldeias que visitou, os caciques foram mortos em conflitos.
Para Benites, a situação é consequência de uma omissão histórica do Estado e a exclusão legal da população. Um passado que ainda reflete na atualidade. Segundo ele, é preciso sanar necessidades imediatas, por exemplo, a alimentação. Concomitantemente, se deve sanar questões que darão segurança a longo prazo, principalmente o direito a terra. Deve haver também uma política de reparação, defendeu.
“A reparação deve acontecer. Ao longo da história, os indígenas foram expulsos das terras e tratados como não humanos”, ressaltou o antropólogo.
Tonico Benites também comentou a ação, em 2012, que envolveu as redes sociais. Usuários trocaram os sobrenomes nos perfis virtuais por “Guarani Kaiowá”. A ação foi feita para prestar apoio aos indígenas durante período de conflitos. “Pelas redes socais, [os indígenas] puderam passar informações mais diretas, que muitos brasileiros não conheciam. Conseguiram chamar a atenção de jornalistas e de políticos”.
O debate Reconhecimento e Direitos Humanos acontece no dia 11, a partir das 10h, e conta com a participação também do escritor e ativista paquistanês Tariq Ali e da jurista brasileira Ela Wiecko Volkmer de Castilho.
Edição: Marcos Chagas