Gil, Caetano, Milton e mais: Artistas, intelectuais e escritores assinam manifesto contra mineração na Serra do Curral

06/05/2022

Sofia Leão

Fonte:https://bhaz.com.br/noticias/minas-gerais/artistas-intelectuais-escritores-assinam-manifesto-contra-mineracao-serra-do-curral/

Artistas

 

Figuras públicas protestam contra a implantação do CMST (Tira O Pé Da Minha Serra/Divulgação)

 

Mais de 500 artistas, intelectuais e escritores de todos os cantos do país assinaram um manifesto, divulgado nesta sexta-feira (6), contra a mineração na Serra do Curral, na Grande BH. Milton Nascimento, Wagner Moura, Maitê Proença, Caetano Veloso, Djamila Ribeiro e Gilberto Gil são algumas das figuras que participam do protesto contra a implantação do Complexo Minerário Serra do Taquaril (CMST) na região.

O documento é endereçado ao governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo); à secretária de Estado de Meio Ambiente, Marília Melo; ao secretário de Estado de Cultura, Leônidas Oliveira; e ao presidente da ALMG (Assembleia Legislativa de Minas Gerais), Agostinho Patrus.

 

“Trata-se do elemento central do brasão da capital mineira, desde sua fundação. Da colina que se destaca na paisagem da região. Do ecossistema que, apesar de maltratado nas últimas décadas, concentra quase 40 espécies de animais e plantas ameaçadas de extinção, abriga nascentes, plantas medicinais, espécies vegetais e animais das mais belas e diversas”, diz o manifesto sobre a Serra do Curral.

Impactos e reivindicações

O texto afirma que o CMST ameaça a região, com mais de 30 milhões de toneladas de minério de ferro extraídas por meio de explosões, provocando emissão de gás carbônico, além de provocar aumento dos níveis de erosão e deslizamento de terra na Grande BH.

“Nós, artistas, intelectuais e escritores de diversas regiões do Brasil, enxergamos a Serra do Curral como um bem que extravasa as fronteiras de Minas Gerais – um patrimônio comum de todos os brasileiros. O Pico Belo Horizonte, tombado pelo IPHAN [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional], também está ameaçado por esse projeto de mineração”, completa o manifesto (leia na íntegra abaixo).

 

Além de pedir a nulidade da licença ambiental de implantação do CMST, a carta aberta pede que o tombamento estadual da Serra do Curral seja aprovado, e que a ALMG coloque em pauta a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 67/21, que prevê o tombamento da serra.

Internautas também podem pressionar o Governo de Minas a não permitir a mineração na área, por meio de um texto formulado pelo próprio site “Tira O Pé Da Minha Serra”, que pode ser enviado aqui.

Mineração na Serra do Curral

O Copam (Conselho Estadual de Política Ambiental) aprovou a mineração na Serra do Curral em uma reunião realizada na madrugada do último sábado (30). O CMST, elaborado pela mineradora Tamisa, possibilitará a lavra a céu aberto de minério de ferro no local, além da instalação de uma unidade de tratamento de minerais, pilhas de rejeito e também bacias de contenção de sedimentos.

A área prevista para a instalação do projeto é adjacente à serra do Taquaril e está localizada na divisa dos municípios de Nova Lima, Sabará e Belo Horizonte. Trata-se da propriedade Fazenda Ana da Cruz, em uma área que corresponde a mais de 100 hectares.

Políticos, entidades e a própria PBH (Prefeitura de Belo Horizonte) buscam impedir a exploração da serra que integra a paisagem da capital mineira. Para Roberto Andrés, arquiteto-urbanista e professor da UFMG, a mineração na Serra do Curral é como se, no Rio de Janeiro, “quisessem minerar o Pão de Açúcar e oferecessem, como contrapartida, plantar árvores em algum outro lugar do estado”.

Tamisa rebate críticas

A mineração na Serra do Curral foi discutida nessa quinta-feira (5) em audiência pública conjunta das Comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e de Minas e Energia da ALMG. Enquanto opositores argumentaram contra o projeto, a mineradora Tamisa (Taquaril Mineração S.A.) rebateu as críticas.

“Se me perguntassem se eu sou contra ou a favor da destruição da Serra do Curral, evidentemente eu seria contra. Acontece que o nosso projeto não vai destruir a Serra do Curral. Isso é enganar a opinião pública”, disse Leandro Amorim, representante da Tamisa, na audiência.

Ele ainda garantiu que a mineradora não pretende abandonar o projeto de instalação do CMST. “O projeto não vai destruir a Serra, então não há de que recuar, a Tamisa não pensa em nenhum momento em recuar”, afirmou.

Também participou da audiência pública um dos responsáveis pelos estudos técnicos realizados pela Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável), o superintendente de Projetos Prioritários, Rodrigo Ribas. Segundo ele, o licenciamento não é para um “megaempreendimento”, já que a quantidade de minério a ser retirada anualmente seria menor do que em outras áreas de mineração no estado.

Manifesto na íntegra

“Excelentíssimo Senhor Governador do Estado de Minas Gerais, Romeu Zema,
Excelentíssima Senhora Secretária de Estado de Meio Ambiente, Marília Melo,
Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado de Cultura, Leônidas Oliveira,
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Agostinho Patrus,

A pandemia atingiu e ainda atinge continentes, países, cidades e lares, homens, mulheres e crianças de maneiras distintas. Mas houve algo em comum entre nós: a incerteza e o desamparo. O mundo parou e sufocou em UTI´s lotadas e ficamos enclausurados cobertos por nossos medos, sofrimentos e angústias enquanto a natureza, aliviada, descansava.

 

Foram muitos os sinais. E mesmo assim continuamos a desmatar, maltratar, extrair, queimar, abusar, saquear, arrancar, torturar, massacrar e matar. Temos sido predadores da terra até virarmos reféns de nossa própria ganância e ignorância. É hora de mudar!

A Serra do Curral é o maior patrimônio paisagístico e ambiental de Belo Horizonte e região. Trata-se do elemento central do brasão da capital mineira, desde sua fundação. Da colina que se destaca na paisagem da região. Do ecossistema que, apesar de maltratado nas últimas décadas, concentra quase 40 espécies de animais e plantas ameaçadas de extinção, abriga nascentes, plantas medicinais, espécies vegetais e animais das mais belas e diversas. A Serra do Curral é um bem raro, que simboliza não só um lugar, mas a cultura que marca a memória de um povo como referência. E um povo sem referência, é um povo sem alma.

Um megaprojeto de mineração – o Mineração Taquaril – está nos ameaçando. Serão mais de 30 milhões de toneladas de minério de ferro extraídas por meio de explosões com uma emissão de gás carbônico suficiente para interferir ainda mais no clima das cidades da Região Metropolitana. O empreendimento vai aumentar os níveis de erosão e deslizamento de terra em uma região com alta inclinação, trazendo riscos para a população e os parques municipais do entorno. As estruturas construídas pelo projeto serão fatais para os córregos Cubano, Triângulo e da Fazenda, além de nascentes da região. A água que infiltra na Serra do Curral abastece o Rio das Velhas e o Rio Paraopeba e alterações nesse pedaço de aquífero afetarão a vida desses Rios e das comunidades que vivem em seu entorno – já tão prejudicadas pelo crime da Vale. O projeto ameaça ainda mais de 50 cavidades espeleológicas, que abrigam espécies raras e possuem importantes funções para a dinâmica das águas na região.

O empreendimento não possui estudos de impacto cultural aprovados pelo IEPHA e pelo IPHAN. O Ministério Público de Minas Gerais já acionou a justiça contra o licenciamento sustentando diversas ilegalidades. A prefeitura de Belo Horizonte também se posicionou contrária ao empreendimento, e avalia recorrer à justiça. A reunião do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM) foi realizada de forma atropelada: mais de 280 pessoas se inscreveram para falar, mas a maior parte não foi ouvida. Causa espanto que o projeto tenha sido aprovado no COPAM às 3 horas da madrugada de um sábado. Queremos explicações.

A Serra do Curral, já tombada em âmbito municipal e federal, está com seu processo de proteção patrimonial estadual em fase final. O dossiê, feito com extremo rigor e qualidade, foi aprovado pelo IEPHA no início de 2021 e deveria ter sido encaminhado ao CONEP (Conselho Estadual de Patrimônio). Vossa Excelência Secretário de Cultura Leônidas Oliveira, porque o projeto ainda não foi votado?

Virando realidade, esse megaprojeto de mineração gerará lucros financeiros milionários às custas de grandes riscos e graves impactos para o patrimônio cultural, para a saúde, a qualidade de vida, o meio ambiente e a segurança hídrica de toda a população de Belo Horizonte e região.

Nós, artistas, intelectuais e escritores de diversas regiões do Brasil, enxergamos a Serra do Curral como um bem que extravasa as fronteiras de Minas Gerais – um patrimônio comum de todos os brasileiros. O Pico Belo Horizonte, tombado pelo IPHAN, também está ameaçado por esse projeto de mineração.

Certos de vossa sensibilidade e discernimento, viemos demandar ao Excelentíssimo Senhor Governador Romeu Zema e à Excelentíssima Senhora Secretária de Meio Ambiente Marília Melo que escutem a nossa voz e anulem a licença de operação da Tamisa, concedida com diversos indícios de irregularidades em uma reunião esvaziada de madrugada. Reivindicamos também ao Excelentíssimo Governador e ao Excelentíssimo Secretário de Estado de Cultura, Leônidas Oliveira, que coloquem de imediato na ordem do dia a aprovação do tombamento estadual da Serra do Curral. Por fim, pedimos ao presidente da Assembleia de Minas, Agostinho Patrus, que coloque em pauta Proposta de Emenda à Constituição 67/21, que prevê o tombamento da Serra do Curral.

A cultura do país e o futuro das próximas gerações agradecem!”.

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