17/03/2019
Em 2008, foram 181 casos registrados pelo SUS, contra 625 no ano de 2017
Entre as consequências do uso de agrotóxicos no Brasil e em Minas Gerais estão as intoxicações agudas. Em 2008, foram registrados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) 181 casos de intoxicação aguda por agrotóxico agrícola em Minas Gerais. Em 2017, esse número foi de 625 casos, um crescimento de 245%. “É uma preocupação que produtores e trabalhadores rurais sejam capacitados no manejo dos defensivos agrícolas e usem os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) de maneira adequada. Até porque (o agrotóxico) se trata de um fator de custo, que impacta o lucro do produtor rural”, explica a coordenadora da assessoria técnica da Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais (Faemg), Aline Veloso. A entidade, segundo ela, oferece cursos com essa finalidade.
A pesquisadora explica, porém, que o aumento do registro de agrotóxicos no país não é necessariamente ruim. “Novos registros podem trazer avanços tecnológicos e produtos com a toxicidade menor. Além disso, o país não conta hoje com defensivos para alguns produtos agrícolas”, afirma. Ela cita o exemplo da palma-forrageira, uma planta usada na alimentação do gado produzida no Norte do Estado e no Vale do Jequitinhonha que não conta com agrotóxico próprio para esse tipo de plantação.
Para o pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp), da Fiocruz, Luiz Cláudio Meirelles, a toxicidade dos pesticidas aprovados nos últimos registros no país pode estar relacionada com o aumento de casos de intoxicação. “Não temos estudos comprovando, mas o registro de substâncias consideradas altamente tóxicas pode influenciar no aumento de intoxicações. E um aumento, inclusive, de intoxicações agudas, de quem tem contato com o produto e passa mal no outro dia. Não envolvem os casos de câncer, por exemplo, que são outro problema grave”, diz. No Brasil, o número de intoxicações agudas por agrotóxico mais que dobrou em uma década. Passou de 2.500 em 2008 para 5.238 em 2017.
“O uso de agrotóxicos na agricultura brasileira é um problema de saúde pública, dadas as contaminações no ambiente, em alimentos e as intoxicações na saúde humana. Se utilizadas de forma errada, as substâncias ficam como resíduos nos alimentos e podem causar sérios danos. As hortaliças estão entre os alimentos em que mais se encontram resíduos de agrotóxicos”, afirma a pesquisadora da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e doutora em fitopatologia, Wânia dos Santos Neves.
Economia regional. A agropecuária, segundo dados da Fundação João Pinheiro (FJP), é responsável por cerca de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais. Em 2010, esse percentual era de 5,6%. Para o pesquisador da FJP e professor de economia do Ibmec-BH Glauber Silveira, existe uma correlação entre produtividade e agrotóxico. “O uso da substância afeta diretamente a produtividade, então é possível fazer essa correlação”, diz. Wânia lembra que Minas Gerais está entre os Estados que mais utilizam agrotóxicos no país. “Para a agricultura, existe um ganho na produtividade com agrotóxicos. Muitos desses produtos são eficientes no controle, mas, quando se olha pelo lado do bem-estar social, se perde quando se coloca em risco a saúde humana e os danos ao meio ambiente”, conclui.
Sustentação. Para o pesquisador da Fundação João Pinheiro (FJP) e professor do Ibmec-BH Glauber Silveira, a agropecuária “segurou” a economia mineira nos anos de recessão, de 2014 a 2016. “Quando o crescimento econômico estava perto de zero, foi por causa da agropecuária que a queda não foi maior”, avalia Silveira. A agropecuária era responsável por 5,6% do PIB mineiro em 2010 e chegou a 6,9% em 2016, último dado da FJP. Na mesma comparação, a indústria passou de 33,2% em 2010 para 24,8% em 2016.
Faltam produtos para controle das pragas nos orgânicos
Opção ao modelo convencional de agricultura, que se baseia em maquinários, fertilizantes, agrotóxicos e sementes produtivas, a agricultura orgânica e agroecológica padece de falta de produtos de controle de pragas. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em 2018, foram 450 produtos aprovados, só 17 permitidos para a produção orgânica, 3,7% do total. “Não é possível encontrar no país defensivos biológicos para a produção agroecológica. Minha plantação de repolho foi atacada por lesmas, e perdi a produção”, critica a advogada e pequena produtora Adriana Alves do Valle.
Ela conta que não conseguiu crédito para iniciar sua produção. “Busquei dois bancos, e ambos solicitavam que eu já tivesse renda com o negócio. Uma delas pediu R$ 200 mil de renda anual. Isso não é viável para um pequeno produtor”, conta.
“Faltam linhas de financiamento para a produção orgânica e agroecológica no Brasil, enquanto não falta para compra de agrotóxicos”, afirma o pesquisador e nutricionista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Rafael Arantes. “Em alguns bancos, o crédito é liberado mais facilmente quando envolve compra de agrotóxicos”, diz o pesquisador da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) André Burigo.
Com uma propriedade de seis hectares e quatro deles preservados de Mata Atlântica, Adriana iniciou em 2018 a produção sem nenhum agrotóxico, no sítio Guatambu do Salgado, em Carandaí, região Central do Estado, e vende sua produção por Facebook e Instagram.