Foto: Bárbara Ferreira
Em uma plenária convocada para ouvir opiniões do público, a candidata ao Senado observa a reação dos convidados com olhar atento a tudo ao seu redor. Quando chega a sua vez de falar, prefere levantar; não consegue discursar sentada. “Desculpa, vou me levantar, tenho TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo) por causa da escola. Passei anos em pé o dia todo, já não consigo falar sentada”, esclarece a professora de um colégio da rede privada de ensino de Belo Horizonte, aproveitando para criticar a forma como instituições de ensino tratam seus educadores. Quando está de pé, a altura e a voz firme mostram a grandeza de Duda Salabert, não apenas em tamanho, mas também em ser o nome do PSOL mineiro na disputa ao Senado.
Duda é a primeira travesti da América Latina a se candidatar ao Senado. Escolheu concorrer a uma vaga na Casa que exige que seus integrantes tenham, pelo menos, 35 anos – mesma idade da expectativa de vida das travestis e mulheres trans no Brasil. Optou também pelo local que mais peca na representação feminina ainda no período eleitoral: neste ano, 82,4% dos postulantes ao cargo são homens – 291, contra apenas 62 mulheres.
Na plenária realizada em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, ela deixa clara a sua intenção: evidenciar como sua candidatura significa resistência e simboliza as estatísticas relacionadas à população travesti e transexual brasileira. Para Duda, a sociedade tem uma dívida histórica com os corpos travestis e transexuais: “Nós lutamos, ainda, pelo conceito de humanidade”.
A professora Duda
Ainda que busque lutar pelos direitos do grupo que representa e enfrentar a LGBTfobia, Duda faz questão de ressaltar que sua pauta central é a educação. Enquanto se preparava para gravar com a equipe da Campanha Libertas na Casa Criativa, em Contagem, Duda perguntou se conhecíamos o espaço e falou sobre a importância dele para a cultura de um dos municípios mais populosos da região metropolitana.
Sua habilidade para pontuar opiniões e ensinar vem de seus 18 anos de experiência como professora de Literatura. Única educadora travesti da rede privada de ensino do país, Duda quer mudar a realidade dos alunos e do corpo docente do Brasil. Uma de suas principais propostas para o Senado é o perdão da dívida do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
Ela conta a história de alunos de pré-vestibular que buscam cursar medicina, e, aos 25 anos, quando se formam, concentram dívida de R$ 1,2 milhão. “Há um endividamento cada vez maior da juventude brasileira. E esse dinheiro é jogado para o grande capital”, argumenta.
Duda também defende o aumento de salários dos profissionais da educação, um ensino público de qualidade e com mais vagas, o fortalecimento da pesquisa e produção tecnológica, além de mais investimentos nos institutos públicos de pesquisa.
Ambientalista e vegana
O meio ambiente também é uma bandeira da candidatura de Duda. Para reforçar a importância de se pensar na preservação ambiental, ela cita o desastre do rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, que aconteceu em novembro de 2015, na cidade de Mariana. “Foi um atentado terrorista protagonizado pela Samarco, matando um rio”, afirma.
Criticando o governo de Fernando Pimentel (PT), que permitiu a flexibilização do licenciamento ambiental em Minas Gerais, Duda alega que pretende fazer o contrário, se eleita. Uma de suas principais propostas é a maior rigidez na concessão de licenças.
Também inclui no seu plano de senadora a criação de políticas nacionais de redução de agrotóxicos e de impostos sobre frutas, legumes, verduras e produtos orgânicos. Quer ainda privilegiar a agricultura familiar e a agroecologia.
Os riscos de uma candidatura travesti
Ao mesmo tempo em que ganha o noticiário por ser a primeira candidata travesti ao Senado, Duda coleciona mensagens de ódio. Após seu discurso na última Parada LGBT de BH, realizada em julho, recebeu mais de 5 mil comentários em seu perfil do Instagram. Antes, o candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) e seus filhos haviam feito postagens em suas redes sociais criticando a candidata.
“Por onde passo, destilam ódio sobre mim”, constata Duda, acostumada a lidar com as agressões. Mas o maior problema aconteceu quando pessoas começaram a avaliá-la negativamente nas redes sociais e a ligar na escola onde continua lecionando, exigindo sua demissão. “Eu sei que, possivelmente, no fim da campanha, posso ser demitida. Mas, se for necessário eu ter que dar um passo atrás para que meus pares deem três passos à frente, eu vou fazê-lo”.
DUDA SALABERT
Cidade: Belo Horizonte (Minas Gerais)
Idade: 37 anos
Cor/raça: Branca
Ocupação: Professora
Família: Solteira
Bens declarados: Tem R$ 30 mil em automóvel
Site: dudasalabert.com.br