08/11/2017
No dia 07 de novembro 2017 o Sindicato Nacional dos Técnicos de Nível Superior das Instituições Federais de Ensino Superior (Atens) realizou o debate : A realidade brasileira – sob os ângulos da política, da economia e da sociedade, que reuniu a cientista política Helcimara Telles, da UFMG, e o economista Marcio Pochman, da Unicamp, ex-presidente do Ipea, com mediação do sociólogo Rudá Ricci.
Resumo das exposições de Mara Telles e Márcio Pochmann no debate, segundo Rudá Ricci:
MARA TELLES
1. Um dos dados da realidade atual é a emergência de partidos e grupos políticos insurgentes que se alimentam da insatisfação com a democracia
2. Pequenos partidos não funcionais pressionam partidos tradicionais sobre a forma de governar e partidos de direita radical já dirigem 8 países da União Européia
3. Na Polônia, mais de 50% das cadeiras que este país possui no Parlamento Europeu são ocupadas pela direita
4. As marcas centrais destes agrupamentos radicais de direita são: a xenofobia e o populismo, variando o programa do liberalismo econômico à defesa de um Estado forte. Não são tão desfavoráveis à Rússia e possuem retórica anti-sistema. Não se trata, portanto, de uma repetição da agenda da direita clássica
5. A direita radical contemporânea possui uma miríade de formas de organização e programa
6. Nasce da insatisfação com a cartelização dos partidos tradicionais
7. Alguns autores explicam esta emergência a partir da convergência entre partidos socialdemocratas e conservadores que quebrou a fidelidade partidária. Outros autores sugerem que os partidos radicais surgem pela emergência das pautas pós-democráticas e temas como a insegurança
8. Os partidos tradicionais diminuíram sua ação junto à base social para se concentrarem na capacidade de governar, abrindo um hiato de legitimação social
9. É importante destacar que os outsiders políticos constroem um discurso de ataque aos outsiders sociais (marginas, comunistas, prostitutas etc), o que, somado ao tema central da segurança, repõe elementos históricos do nazismo como a ascensão da polícia para caçar criminosos, independente da decisão ou intervenção judicial.Trata-se de uma política da polícia
10. O ethos bolsonariano não é, contudo, um ethos nazista. Bolsonaro se apresenta como uma direita alternativa. O bolsonarismo utiliza como instrumento as redes sociais para disseminar valores e memes junto à juventude. Ataca esquerdas e liberais e faz forte apelo à masculinidade.
MÁRCIO POCHMANN
1. O atual quadro político, social e econômico do Brasil gera um discurso de desalento mas, ao contrário, se aproxima de outros dois momentos decisivos de mudança de patamar da sociedade brasileira: a de 1880 e a de 1930.
2. A década de 1880 foi a que o Brasil rompeu com a escravidão e se inseriu nas estruturas formais das relações capitalistas. O processo de industrialização forjada por Rui Barbosa não vingou, mas direcionamos a lógica econômica para o que seria o primeiro ciclo de globalização do capital.
3. A década de 1930 foi a de urbanização e industrialização do Brasil – processo que durou 15 anos.
4. O paralelo entre estas duas décadas passadas e a atual é que as três se revelaram momentos decisivos de mudança do patamar de sociedade em que estávamos em virtude da convergência de duas transições simultâneas.
5. A primeira transição é de natureza externa, provocada por forte tensão no centro dinâmico do capitalismo. Hoje, somente 11 países possuem orçamento público superior ao orçamento das grandes corporações transnacionais. Esta situação indica uma instabilidade no centro nervoso do capitalismo até então capitaneado pelos EUA, em franca decadência como força hegemônica, a despeito de ainda ser central no mundo contemporâneo.
6. A segunda transição que vivemos é a mudança na estrutura de produção que alteram as regras e normas sociais. A classe média assalariada e aquela oriunda do serviço público estão em extinção no Brasil. Nós nos desindustrializamos aceleradamente e somos liderados, na economia, pelo setor de serviços. Esta nova situação altera o modo da classe média pensar, muitas vezes reagindo contra este novo mundo e pregando um discurso saudosista que não poderá ser mais refeito.
7. Precisamos entender que o discurso e queixa da classe média tradicional tem, do seu ponto de vista, sentido, já que perde segurança e estabilidade históricas e mergulha num campo de incertezas. Percebeu a prosperidade das classes subalternas ao mesmo tempo em que seu mundo ruía. Ora, hoje, a classe média assalariada é substituída pela classe média “proprietária”, conformada em “pessoa jurídica”.
8. O problema das esquerdas não são propriamente as direitas, que fazem o seu papel político. O problema é não termos um projeto nacional, não enfrentarmos nossas insuficiências e aprofundarmos um diagnóstico mais preciso sobre estas mudanças e oportunidades que se abrem em nosso país.
9. A grande questão é: quais os projetos que se apresentam para enfrentar a atual transição (interna e externa) que citei?