27/07/2021
Fonte:https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2021/07/27/interna_gerais,1290231/reviravolta-atingidos-de-mariana-reabrem-acao-de-r-35-bi-na-inglaterra.shtmlEm uma reviravolta rara nas cortes do Reino Unido, advogados dos atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, conseguiram reabrir, nesta terça-feira (27/07), o pocesso de 5 bilhões de libras (R$ 35 bilhões) contra a BHP Billiton na Corte Real de Justiça (Royal Courts of Justice), em Londres.
Em batalha judicial desde 2018 no Reino Unido, o escritório PGMBM representa 25 municípios, igrejas, 530 empresas e mais de 200 mil atingidos, a maioria ainda não indenizada no Brasil, mesmo 6 anos depois. Acionam a mineradora BHP Billiton em sua sede na Inglaterra, devido às indecisões no Brasil e uma vez que a companhia é controladora da Samarco, ao lado da Vale. A Samaco operava a barragem que se rompeu, em 2015.
A indenização aos atingidos pela devastação e morte provocados com o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, foi negada em primeira instância, em julgamento em 2020 (veja abaixo a linha do tempo), sendo o recurso indeferido em 2021, o que ensejou um recurso raríssimo para evitar “grande injustiça”, que desta vez foi aceito, permitindo a reabertura do recurso do processo.
O rompimento da barragem matou 19 pessoas e devastou a Bacia Hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e Espírito Santo. Caso aceita a jurisdição para se prcessar a BHP no Reino Unido esse será o maior processo oletivo da história das cortes britânicas.
O escriório PGMBM afirma que, mediante recurso, podem estabelecer jurisdição na Inglaterra contra a BHP Group Plc, uma empresa domiciliada na Inglaterra, e o BHP Group Limited, uma empresa domiciliada na Austrália.
Tom Goodhead, advogado e sócio do PGMBM disse que “este é um julgamento monumental e nossos clientes sentem que esta é a primeira vez que um juiz reconhece a importância deste caso”.
“Depois que o caso foi encerrado em março, ficou no ar a sensação de que aquele era o fim do caminho para as vítimas. Portanto, é incrivelmente recompensador para minha equipe poder dizer a eles que ainda acreditamos que eles verão uma reparação satisfatória nos tribunais ingleses”, afirma Goodhead.
Foram utilizados precedentes internacionais que tinham sido ignorados, mas que desta vez acabaram aceitos. Foram três magistrados a poferir a atual decisão. Lord Justice Geoffrey Vos (o Master of the Rolls, Chefe da Divisão Civil do Tribunal de Recurso), Lord Justice Nicholas Underhill (Vice-presidente do Tribunal de Recurso) e Lady Sue Justice Carr determinaram que o caso deveria ser reaberto e que deveria ser ouvido no Tribunal de Apelação.
“Embora compreendamos totalmente as considerações que levaram o juiz a sua conclusão de que a ação deve ser rejeitada, acreditamos que a apelação tem uma perspectiva real de sucesso”, diz a decisão.
Um relatório especial da ONU de 2020 alegou que os responsáveis pelo desastre não conseguiram apoiar ou indenizar efetivamente as vítimas.
A BHP infrmou estar ciente da decisão da Corte de Apelação inglesa de reabrir o processo contra a empresa no Reino Unido e permitir que os Autores recorram do julgamento da Corte Superior de Manchester. “A decisão de hoje não reverte o julgamento de extinção, mas permite que o recurso dos Autores contra o referido julgamento seja apreciado pela Corte de Apelação”.
A mineradora reiterou a sua posição de que o processo não deve continuar no Reino Unido, uma vez que as questões levantadas pelos Autores estão cobertas pelo trabalho em andamento da Fundação Renova, por decisões judiciais dos Tribunais brasileiros ou que são objeto de processos judiciais em andamento no Brasil.
Há pouco mais de um mês (22/06) a reportagem do Estado de Minas acompanhou e publicou com exclusividade mais um embate em Londres entre gigantes do direito internacional em torno do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana.
Os advogados do escritório anglo-americano-brasileiro PGMBM, que representa os atingidos, e o corpo legal da multinacional BHP Billiton debateram a admisibilidade de um processo nas cortes do Reino Unido.
Logo no início, os magistrados deixaram claro que não se ateriam aos méritos da causa, mas às razões técnicas para possibilitar ou não uma apelação. Os advogados dos atingidos defenderam que o juiz errou ao não permitir o último recurso. Já os representantes da BHP asseguraram que a decisão foi correta.
O primeiro a falar foi o representante dos advogados dos atingidos. Os principais argumentos sustentaram que o juiz de apelação não considerou os termos trazidos sobre jurisdição (poder processar a BHP no Reino Unido) e abuso (trazer custos extremos para as cortes ou duplicar ações já em curso no Brasil).
“Se a maioria dos requerentes estivesse processando a BHP – ou o grupo do qual faz parte – no Brasil, poderia até se ter a impressão de duplicação. Mas 75% dos requerentes não acionaram nenhum deles no Brasil”, declararam os advogados da PGMBM. Os defensores dos atingidos ainda pontuaram que mesmo elegíveis para um dia receber recursos da ação civil pública de R$ 155 bilhões movida pelo Ministério Público Federal, essa possibilidade não invalidaria o direito de processar quem os prejudicou onde decidirem. Principalmente pela ação estar parada desde janeiro de 2017.
Em seguida, os defensores da BHP Billiton reforçaram seus principais argumentos, dizendo que seria um abuso duplicar ações já existentes no Brasil, onde consideram que o processo de reparação promovido pela Fundação Renova está caminhando satisfatoriamente.
“Milhares de requerentes conseguiram justiça no Brasil para suas reparações. Nada menos do que 154 mil pessoas já receberam algum recurso da Fundação Renova ou abriu seus próprios procedimentos legais para indenização. Já está em andamento um veículo que traz a compensação (Renova). A 12ª Vara da Justiça Federal (Belo Horizonte) tem consedido reparação (pelo Processo de Indenização Simplificado)”, afirmaram os defensores da multinacional.
Ao final, o trio de juízes considerou que os argumentos dos dois lados foram suficientes para se chegar ao “fundo da questão”, mas afirmam que precisarão de tempo para deliberar e depois trazer uma decisão a ser apresentada na presença dos advogados.
Na primeira instância, o juiz da Corte de Justiça Civil de Manchester considerou que seria um abuso de jurisdição julgar a BHP ao mesmo tempo que processos ocorrem no Brasil. Já os advogados da PGMBM afirmam que não há justiça suficiente sendo feita no Brasil onde as pesoas aguardam há 6 anos por ressarcimento e reparação.
O primeiro entendimento da Corte de Apelação manteve a decisão de primeira instância. Mas uma contingência do código civil para que grandes injustiças não sejam cometidas foi concedida aos atingidos e por isso a apelação foi novamente discutida.