17/05/2023
Fonte:https://www.almg.gov.br/comunicacao/noticias/arquivos/Suposta-retomada-de-mineracao-na-RMBH-preocupa-agricultores-familiares/Atividades da Mineradora Santa Paulina em Ibirité e Sarzedo também ameaçaria mananciais. Empresa alega que apenas está limpando a área para recuperação.
Reunião conjunta das comissões de Participação Popular e de Assuntos Municipais debateu a situação suspeita da Mineradora Santa Paulina, na RMBH Álbum de fotosFoto: Guilherme Dardanhan
Dezenas de moradores da zona rural de Ibirité e Sarzedo, municípios vizinhos na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), sobretudo agricultores familiares, reforçaram na manhã desta quarta-feira (17/5/23) o temor de que a retomada das atividades da Mineradora Santa Paulina possam comprometer sua sobrevivência.
E, pior, que isso também ameace mananciais situados no entorno do Parque Estadual Serra do Rola Moça, vitais para a continuidade da produção e o abastecimento de água daquela região e de dezenas de bairros do Barreiro, na Capital mineira.
O problema foi debatido em audiência pública conjunta das comissões de Participação Popular e de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), atendendo a requerimento assinado por 16 deputados da oposição, sendo o primeiro signatário o deputado Leleco Pimentel (PT), que conduziu a reunião.
Fundada em 1935 e supostamente inativa na região desde 2010, a Mineradora Santa Paulina estaria retomando suas atividades, conforme denunciaram os participantes da audiência, mesmo após o arquivamento de seu processo de licenciamento ambiental em 2021.
Caminhões de minério já estariam circulando em uma estrada rural de Sarzedo que dá acesso a uma gigantesca cratera deixada na antiga área de mineração da empresa, esta situada em Ibirité, colocando em risco inclusive a vida dos moradores da região.
O gerente institucional da mineradora, Cristiano Barbosa Cheib, confirmou o tráfego de caminhões, mas ele alega que não está sendo feita a extração de minério, nem há planos para isso no futuro. Segundo ele, o que está em andamento é apenas o escoamento de várias pilhas de material estéril já lavrado, no total de 1,076 milhão de toneladas, para comercialização e posterior recuperação da área.
Para essa atividade, segundo ele, não seria necessário licença ambiental, embora a atividade teria sido autorizada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad) por meio da superintendência regional (Supram), após supostamente comprovar risco ambiental da permanência do material no local.
O executivo também garantiu que a empresa fez acordo com a prefeitura local para utilização da estrada e, como contrapartida, está realizando melhorias na via e em uma escola municipal na região.
As explicações dele foram interrompidas diversas vezes por protestos e questionamentos do público presente no Auditório da ALMG. A reunião transcorreu em clima tenso, com muitos bate-boca e paralisações. Minoria no local, algumas pessoas também defenderam a manutenção das atividades da empresa e os empregos por ela gerados.
“Não existe mineração sem respeito a leis ambientais. Da mesma forma, respeitamos e não queremos acabar com a agricultura familiar, que é uma atividade lícita e honesta para a sobrevivência do brasileiro, assim como é a mineração”, pontuou Cristiano Cheib.
Respondendo a questionamentos da deputada Bella Gonçalves (Psol), o representante da Mineradora Santa Paulina revelou que na atividade está sendo utilizada uma frota terceirizada de 60 caminhões que, pelos cálculos da parlamentar, demorariam mais de dois anos para finalizar o trabalho, com inúmeros transtornos nesse período.
Mas, ainda de acordo com ele, apenas dez empregados são mantidos no local, quatro no escritório e seis vigias, o que atestaria que a planta está inativa. A deputada ainda sugeriu uma visita técnica da ALMG ao local, acompanhado de peritos, para apurar se as alegações do representam da empresa são verdadeiras.
O deputado Leleco Pimentel também fez diversas críticas à mineradora e à atividade minerária em geral, denunciando inclusive relações suspeitas com integrantes do poder público para garantir a manutenção das atividades a despeito das ameaças ao meio ambiente e à sobrevivência da população mais vulnerável. “O processo de corrupção e da mineração andam juntos”, criticou.
Leleco Pimentel também leu ofício enviado pelo promotor Domingos Ventura de Miranda Júnior, da Comarca de Ibirité e Sarzedo, que não pode comparecer à audiência, informando que as atividades suspeitas da Mineradora Santa Paulina já são investigados em quatro inquéritos civis que tramitam em fase avançada.
Entre os diversos questionamentos feitos ao longo da reunião à atuação da mineradora na região, Henrique Lazarotti de Oliveira, integrante do Movimento Serra Sempre Viva, disse que a autorização para retirada de material do local, emitida pela Semad, teria contrariado parecer dado anteriormente por técnicos do mesmo órgão.
Ele também apresentou autos de infração supostamente feitos contra a empresa apontando problemas como transporte de material com indícios de ter sido lavrado recentemente e o tráfego de caminhões carregados pelo interior do Parque da Serra do Rola Moça. Os documentos foram entregues aos deputados para balizar novas ações das comissões da ALMG.
Décio Rodrigues, do Conselho Municipal de Defesa e Conservação do Meio Ambiente (Codema) em Ibirité, apontou que entre as supostas irregularidades já cometidas pela empresa no passado está inclusive a abertura de estrada clandestina em área de proteção ambiental e retirada da vegetação no topo da serra, questionando inclusive a viabilidade das contrapartidas anunciadas agora.
Ele também denuncia conivência do Executivo municipal ao permitir que a mineradora utilizasse da estrada na zona rural sobre desculpa de escoamento da produção local. “Minério de ferro é extração, não produção. O minério retirado não nasce de novo”, aponta.
O assessor da Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais, Frei Gilvander Luis Moreira, pediu uma intervenção rápida das comissões da ALMG diante da gravidade do problema que ameaçaria cerca de mil famílias produtoras de chuchu e hortaliças na região.
“Essa empresa esteve envolvida em uma série de irregularidades ao longo do século passado até que foi proibida de minerar em 2010. Não sabemos como permitiram isso no passado e a continuidade disso agora é inadmissível”, afirmou.
Na mesma linha, o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da Silva, defendeu que o Estado precisa repensar os limites da mineração no Estado após as tragédias registradas em Mariana (Central), em 2015, e Brumadinho (RMBH), em 2019.